Nesta quarta-feira, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado deverá votar o substitutivo à Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 11 de autoria do senador Aécio Neves, que altera a tramitação das Medidas Provisórias no Congresso Nacional.
Aprovado por unanimidade na CCJ, o substitutivo tem o apoio formal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e obteve aprovação das bancadas do governo e da oposição na CCJ por trazer mudanças que restringem o uso excessivo das MPs pelo governo federal.
O senador Aécio Neves defende três pontos importantes para garantir a constitucionalidade das medidas provisórias. São eles: garantia de prazos definidos para avaliação cuidadosa das MPS na Câmara e no Senado; necessidade de uma instância que defina se uma MP pode ser aceita após análise da sua relevância e urgência; e a proibição do “contrabando” de matérias, impedindo que uma medida provisória trate de mais de um tema.
Leia abaixo artigo do senador Aécio Neves publicado no jornal O Globo, no último domingo (03/04).
O dia D das MPs
A partir desta semana, o Congresso Nacional terá a histórica oportunidade de definir, pela vontade da maioria, que deseja desempenhar na democracia brasileira, quando deliberar sobre a mais importante matéria legislativa em no Parlamento: a revisão do rito das medidas provisórias.
Estaremos diante de uma escolha crucial entre o caminho da necessária recuperação dos princípios básicos que regem as prerrogativas essenciais do Congresso ou o adensamento de uma subserviência que não serve ao país.
Ao relatar a emenda proposta pelo presidente José Sarney que trata do tema busquei agregar propostas fundamentais à análise de matérias com essa natureza e complexidade, partindo do pressuposto que as medidas provisórias deveriam funcionar restritas às condições de excepcionalidade, previstas pela Constituição, e não substituir o rito legislativo.
Neste caminho, buscamos nos manter fiéis a um forte anseio da maioria. Animou-nos o desprendimento responsabilidade com que o debate foi travado e a ampla negociação que antecedeu o fechamento de um acordo unânime no âmbito da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, com o aval inclusive da liderança do governo, que celebrava um passo importante na direção da recuperação da autonomia responsável do legislativo federal.
O recuo por parte de algumas dessas lideranças em relação ao compromisso acordado e à palavra empenhada, que comprometa as regras básicas de confiança mútua que balizam e legitimam os processos de negociação política, não abala o esforço coletivo que todos precisamos fazer para tornar viável um novo entendimento.
Volto ao centro da questão para desmistificar a ideia de que a aprovação da matéria representaria uma derrota e irreparável perda de poder do governismo. Não é verdade.
Em 2001, na condição de presidente da Câmara dos Deputados, levei ao presidente Fernando Henrique a proposta alteração do rito até então vigente da tramitação das MPs, que permitia reedições sucessivas sem necessidade aprovação pelo Congresso. Registro, por justiça, que o então presidente aceitou o novo entendimento que foi aprovado com o apoio de todos os partidos políticos com presença no Parlamento.
Naquele momento, prevaleceu a compreensão da necessidade do reequilíbrio entre os poderes sobre a tentação hegemonia plena. Não houve derrotados ou vencedores, como hoje se tenta impingir a tudo, no autêntico cabo de guerra que se transformou a negociação política. Naquele momento venceu o país.
A oportunidade de rediscussão da matéria sempre significou o degrau seguinte a ser vencido.
Para tanto, três questões são fundamentais a um amplo entendimento:
1. A garantia de tempo suficiente para que cada uma das Casas do Congresso possa discutir as MPs, impedindo, assim, que elas alcancem a análise do Parlamento engolfadas pelos prazos legais, como tem reiteradamente acontecido,impedindo um exame cuidadoso e responsável de cada matéria.
2. A necessidade de haver uma instância que, também com prazo definido, examine a relevância e a urgência da como prevê a Constituição, aprovando ou não sua admissibilidade.
3. E a constitucionalização da vedação ao “contrabando” de matérias estranhas à natureza de uma MP original, sistematicamente tem ocorrido, sem qualquer constrangimento.
A relevância desse debate nos adverte para os riscos que corremos de permitirmos que o tema seja reduzido a uma das muitas batalhas políticas entre governo e oposição. Definitivamente não é, até porque a luta pelas prerrogativas do Congresso é um dever que está acima da condição transitória de cada parlamentar, como oposição ou governo. Prerrogativas que sequer nos pertencem, mas à população, que nos delegou a inegociável responsabilidade de exercê-las.
Como se vê, este não é um tema árido, afeito apenas ao mundo da política e aos especialistas. Ele tem tudo a ver os valores básicos do país que sonhamos e queremos ser e com o Parlamento que merecemos e podemos ter.
Aécio Neves é senador pelo PSDB e foi governador de Minas Gerais