Aécio Neves – Entrevista – Encontro com Sérgio Guerra e Tasso Jereissati

Local : Belo Horizonte

Assunto: Presidente do PSDB Sérgio Guerra, presidente do Instituto Teotônio Vilela Tasso Jereissati

SEM REVISÃO

Primeiro, eu quero dizer da alegria de receber aqui duas das mais expressivas lideranças do meu partido, o presidente Sérgio Guerra e o senador Tasso Jereissati, presidente do ITV, que terá um papel absolutamente estratégico na construção da imagem do partido, na definição estratégica de quais são os temas que vamos efetivamente defender e na construção da nova cara do PSDB. Temos nos reunido permanentemente em Brasília. Em razão da minha ausência nessas últimas semanas, em função do acidente que eu tive, eles fizeram a gentileza de vir aqui para que essas conversas não fossem interrompidas em razão, inclusive, do ambiente político que estamos vivendo que nos leva também a estabelecer algumas formas de ação.

Sobre esses últimos episódios, quero dizer que está se criando no Brasil algo novo, inusitado para mim, e talvez novo também em nível mundial que é a ausência ou abdicação de responsabilidade da Presidência da República em relação aos seus aliados. Quando um eleitor vota no candidato à Presidência da República, delega a ele a responsabilidade para conduzir o governo e cada um dos seus ministérios, das empresas públicas e deve cobrar desse presidente que recebeu a delegação pelos equívocos que ocorram e devem cumprimentá-lo também pelos êxitos que venham a ocorrer. O que eu vejo é uma tentativa de setores do PT de lavarem as mãos e dizerem que não temos nada com isso. Isso é o maior dos mundos. O governo federal e a Presidência da República é que são responsáveis não apenas pelas nomeações dos ministérios, sejam eles do PT, sejam eles dos partidos aliados, e do que ocorre em cada um desses ministérios.

O grave é isso. Está ocorrendo um processo que estamos aí hoje já assistindo, perverso para com o Brasil, há muito tempo. Porque essas questões não são questões novas e um dado também que me chama a atenção. Nenhuma dessas demissões ou afastamento de dirigentes públicos, ministros e outros se deu pela ação do governo. Pela ação direta do governo, pelo governo ter identificado a partir dos seus órgãos de controle, ou mesmo com a ação do Ministério Público, que houvesse desvios. A imprensa brasileira é que levou o governo a defensivamente, afastar essas pessoas. Isso também é preocupante. Então, o que me parece é que há uma certa passividade no governo federal, ou para não dizer uma certa cumplicidade, com alguns mal feitos. Se não houver denúncias da imprensa, fica tudo como está. Esse governo não é um governo novo. São nove anos de um mesmo governo, de um mesmo grupo político. E aí a expressão do presidente Sergio Guerra e do ex-senador Tasso é muito correta: se há uma herança maldita do ponto de vista ético, ela é de absoluta e inteira de responsabilidade do atual governo. O que eu posso dizer é que, encerrado o primeiro semestre, é um primeiro semestre extremamente negativo, talvez o mais negativo do que qualquer governo da nossa história política recente tenha tido.

O governo não agiu, não tomou medidas objetivas do ponto de vista de infraestrutura. O governo não enfrentou estrategicamente a questão da educação de qualidade, não colocou para votar no Congresso, por exemplo, a Emenda 29. Não nos permite fiscalizar o excesso de transferência de recursos subsidiados do Tesouro para o BNDES como estamos querendo fazer inclusive na LDO.

Não permite investigação sobre nenhuma denúncia que ocorra em relação ao governo. Estabeleceu um rolo compressor no Congresso Nacional em torno das medidas provisórias que não aceitou ainda rediscutir. Eu volto a Brasília, mesmo com esses problemas que ainda estou vivendo, na próxima segunda-feira para tentar construir algo que não é para a oposição, nem tampouco para o governo, é para o país, que seria a votação, na semana que vem, de um novo rito de medidas provisórias.

Então, nesse primeiro semestre o governo andou para trás. Acho que a avaliação final, a contabilidade final do governo é muito triste porque o governo se viu tomado por uma agenda negativa, extremamente negativa, que imobilizou as ações construtivas para o Brasil. Quem sabe, no segundo semestre, possamos ter, como brasileiros, um governo que realize mais e que não fique apenas refém da suas próprias dificuldades. Dificuldades criadas exclusivamente pelo governo e eu encerro dizendo, ou talvez repetindo o que eu já disse algumas vezes, a oposição tem tido dificuldades. Dificuldades sim, mas as dificuldades da oposição vêm, sobretudo, da posição do governo hoje, e de setores do governo, que não satisfeitos em serem apenas governo, exercem até com muito mais competência que nós, o papel de oposição. O que vemos é que a base que é hoje governo e, ao mesmo tempo, é a mais vigorosa oposição a esse governo que elegemos.

Confins ficou fora da privatização. Existe uma série de medidas agora que está sendo divulgada pelo governo federal que Confins não vai entrar como questão de justiça e outras coisas mais. E, agora, com a queda de Alfredo Nascimento, licitações para BR e Anel tudo isso vai ser prejudicada. Como vai ficar?

É lamentável. Isso não é de agora. Estamos denunciando isso há oito anos. Eu fui governador por oito anos, cobrei pessoalmente do ministro, inúmeras vezes. Existem vários documentos nossos cobrando. Os seis trechos de cidades que não tinham ligação asfáltica de responsabilidade do governo federal não foram feitos, enquanto mais de 200 de responsabilidade do governo (estadual) foram feitos. Cobramos a questão do Anel incessantemente. Cobramos o processo de investimento na 381, a 040, dentre tantos outros investimentos em infraestrutura. Nada aconteceu. E estamos vendo agora pelo menos parte das razões porque nada aconteceu. O modus operandi dentro do Ministério dos Transportes. Então, o que cabe a mim como ex-governador do estado e como senador da oposição é denunciar o descaso desse governo para com as coisas de Minas. Onde estão os recursos do metrô? Não falo apenas do governo da Dilma, falo dos últimos oito anos. Não se fez um palmo de metrô em Belo Horizonte. Há cinco, seis anos atrás, o governador Anastasia ainda era secretário, estivemos com o governo falando sobre a concessão do aeroporto, inclusive com o prefeito Pimentel, na época, sobre a concessão do aeroporto de Confins, seis ou sete anos atrás. O que aconteceu de lá para cá? Absolutamente nada. Parece que o governo acordou agora, ficou sabendo no início desse ano que a Copa vai ser no Brasil, cria um sistema diferenciado de licitações que me preocupa muito. Vamos ter problemas graves, escrevam o que estou dizendo, no futuro, com esse processo, que permite a um servidor público, vazando uma informação, contaminar todo o processo licitatório. A civilização veio no caminho da transparência e da compreensão de que a transparência das informações, em todos os setores da vida pública, é o maior controle que a sociedade pode ter, é o maior aliado da sociedade para controlar ações do governo. O governo vem no caminho inverso da transparência com esse regime diferenciado. Especialistas têm alertado para o perigo que ele representa, você permitir que se contrate uma obra sem projeto executivo, eu fui governador do estado, eu sei o que representa isso. Você fazer um projeto básico significa você estimar custos que na verdade você não tem nem idéia de quais serão. Portanto, permite um acréscimo no contrato quase que infinito adiante. Estamos na direção contrária. E qual o argumento do governo? Não temos prazos. Não temos prazos porque o governo infelizmente só soube agora que a Copa do Mundo vai acontecer no ano de 2014. Apesar do presidente Lula, eu próprio e tantos outros governadores termos estado há cerca de quatro anos em Zurique, quando foi anunciado que a Copa do Mundo seria no Brasil. Que medida se tomou naquele instante? Porque não se falou de concessões no dia seguinte daquela reunião? Porque não se falou em transporte de massa, em infraestrutura? Então, o único responsável por eventuais atrasos na Copa do Mundo e relativos às Olimpíadas no Rio é o próprio governo, por inércia, por incapacidade de tomar decisões. Então, essa responsabilidade não será nossa, e o caminho que o governo buscou para superar esse atraso, essas dificuldades, é extremamente perigoso. E vamos estar absolutamente vigilantes para que não seja mais uma oportunidade para fazer mau uso do dinheiro público.

E a oposição, como está definindo seus rumos?

Com cautela, com absoluta serenidade. Temos que viver cada momento. O PSDB passou por sua eleição nacional em um processo de extrema unidade, vocês estão aqui frente a dois grandes vitoriosos nesse processo. Há unidade, tanto que não houve disputa no partido. O companheiro José Serra assumiu a Presidência do Conselho Político do Partido e terá lá uma contribuição importantíssima a dar, o senador Tasso, à frente do ITV, será o grande consultor da nossa nova estratégia de comunicação com a sociedade. O Sérgio Guerra, no comando do partido, com o apoio unânime da Executiva, será o grande estruturador das nossas bases para essas próximas eleições. Vamos fazer um belo papel nas eleições municipais e, aí sim, após as eleições municipais, no início de 2013, é hora de estarmos conversando com outras forças políticas, no nosso campo, prioritariamente, mas também eventualmente já se tenham cansado do modus operandi do atual governo e que possam construir ao nosso lado um novo projeto. O PSDB estará firme para 2014, mas no momento certo. Não vamos inverter a lógica. Agora. É construir uma estratégia para termos muitos bons resultados nas eleições de 2012, e estou confiante que isso vai acontecer.

O senhor acha que o senador Alfredo Nascimento deve responder ao Conselho de ética?

Acho que tanto em relação ao senado e ex-ministro Alfredo, quanto a todos os outros malfeitos, para usar um termo que o governo adotou lá atrás, o ato simples da demissão não pode interromper as investigações. Porque, senão, estamos ensinando contrariamente ao que seria correto. Esse episódio tem que ser pedagógico. Seja no Conselho de Ética, no Ministério Público, é preciso que as investigações continuem nessa área. É preciso que avancem em outras áreas. Tive notícia essa semana, vim a saber disso por uma revista semanal, e até pelo noticiário dos principais jornais, que reproduziram essa matéria, que já há uma investigação do Ministério Público em torno da empresa do filho do ministro há muito tempo, há mais de ano, não sei exatamente há quanto tempo. Será que isso não chamou a atenção do governo? O governo não tinha ciência disso para poder a partir daí tomar as próprias iniciativas, cobrar explicações? Ou resolver esperar ou que isso passasse sem a percepção da sociedade ou precisava esperar a denúncia da imprensa? Então, acho que as investigações não podem interrompidas em razão do afastamento desse ou daquele envolvido, até para que eventualmente, quando for o caso, alguém citado ou envolvido possa ser inocentado. Já aconteceu isso no passado. Não se pode é interromper as investigações. Cabe à oposição cobrar dos órgãos competentes e intragoverno como a Controladoria Geral, extragoverno como o Ministério Público e o Poder Legislativo que essas investigações possam continua ocorrendo. Retorno a Brasília na próxima segunda-feira já para conversar com meus companheiros de bancada e saber qual será a nossa posição.

Senador, a oposição iniciou o ano um pouco dispersa. Talvez em função do novo governo, as defecções no DEM. E, em um mês, são dois ministros importantes do governo Dilma que se foram. O senhor acha que esses episódios podem ajudar a unir a oposição em torno de um projeto?

Sempre disse o seguinte: cobrava-se muito da oposição logo no momento pós-eleitoral uma grande articulação, um grande combate ao governo. Não é assim que as coisas funcionam. A política tem também a sua dinâmica própria. Quem venceu o governo foi o PT. A expectativa, inclusive, da população brasileira era em relação às ações do PT, a montagem do governo, suas novas prioridade, o que esse governo sinalizaria para o país. E a oposição tinha que, sim, catar seus cacos, reunir-se, reorganizar-se no sentido de reencontrar-se, inclusive, em quanto projeto para o país. Isso aconteceu em relação ao DEM, com os problemas que sabemos que houve com a criação de um novo partido, mas no DEM hoje é um pouco menor, mas tem uma unidade muito clara de comando. O PSDB também teve suas discussões internas, mas chegou ao final com uma unidade clara de comando, e agora o que estamos fazendo, inclusive nessa conversa aqui, é falando de estratégia. Quais são, além do combate vigoroso aos desvios, aos malfeitos e a defesa intransigente da ética, quais são as grandes bandeiras do PSDB. Vamos fortalecer nossa discussão em cima da questão municipalista. Continuo a dizer que grande parte dos problemas do Brasil hoje, inclusive esse do Ministério dos Transportes, dizia lá atrás, está na fragilização dos municípios e dos estados, na centralização dos recursos tão fortemente nas mãos da união. Apresentei um projeto já no Senado, logo no início da minha gestão e falei sobre ele naquele meu pronunciamento defendendo e vou voltar a falar sobre isso semana que vem em Brasília, a estadualização das rodovias federais. Não dá para deixar tanto recurso nas mãos do governo federal no que diz respeito à infraestrutura, porque a prioridade, quem conhece é o estado, muitas vezes é até o município. Quem tem condições de fazer parcerias, seja público privadas, seja com os municípios, são os estados. Uma parcela importante desses recursos que vão para o Ministério dos Transportes deveria estar indo, independente de qual seja o governo ou o governante, por critérios estabelecidos, do volume da malha, da trafegabilidade da malha, para cada estado da federação. Obviamente a União teria ainda o papel, mas o papel central, de definir qual estada seria duplicada, qual que vai ser concedida para ser pedagiada, qual que vai ser mantida pela administração direta. Isso tem que caber aos estados. Teríamos evitados problemas dessa gravidade se não houvesse essa centralização tão grande de recursos e esse tipo de, vamos dizer, estabelecimento de prioridades que estamos vendo hoje. O estabelecimento da prioridade como se dá? Alguém que possa vir para o partido, alguém que tenha mais prestigio com o ministro. E não se enganem, isto está ocorrendo em outras áreas. Então, a descentralização será uma das marcas fundamentais do novo PSDB. Falarmos em refundação da federação será algo agora permanente para nós. Falarmos de fortalecimento dos municípios. Vamos zerar e defender fortemente a tarifa de saneamento porque as empresas de saneamento estão hoje pagando mais tributos do que fazendo investimentos em saneamento. No campo da energia, o governo federal cobra mais de 14 tributos que podem, se não deixar de ser cobrados, como acontece com o ICMS para determinada faixa, pode sim vir a diminuir em até 20% as contas de luz. Não podemos continuar aceitando que o governo capitalize o BNDES na forma como vem fazendo e o BNDES subsidie os grandes grupos empresariais brasileiros sem qualquer lógica como está acontecendo agora nesse mal fadado entendimento do Carrefour. Eu tenho uma proposta que está sendo discutida nesta semana e na semana que vem em torno da LDO, que obriga que qualquer nova capitalização do BNDES passe pela discussão no Congresso. Esse é um recurso do Tesouro. Não é correto dizer que o BNDESPar não é recurso público porque é recurso público em última instância sim. Então, é uma série de ações que deveriam estar sendo feitas pelo governo e não estão. Então, serão cobradas por nós enquanto oposição. Vejo um momento positivo para a oposição no Brasil e vamos ter apenas serenidade e calma para construirmos a nossa agenda no tempo certo.

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