Aécio Neves – Entrevista em Brasília

O presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves, concedeu entrevista coletiva, nesta quinta-feira (10/09), em Brasília. Aécio falou sobre rebaixamento da nota do Brasil, entrevista do Joaquim Levy, ajuste fiscal, encontro com economistas do PSDB, movimento pró-impeachment e crise econômica.

Leia a transcrição da entrevista do senador:
Sobre a entrevista do ministro da Fazenda Joaquim Levy.

Estamos, como todos os brasileiros já percebem, vivendo hoje o caos anunciado e diferente do que diz a presidente da República, anunciado há muito tempo. A presidente quer passar a impressão de que só soube do agravamento da crise após as eleições. Isso mais uma vez não é verdade. Falta com a verdade a presidente da República. Porque já no primeiro semestre de 2014 nós já tínhamos uma queda de receita em relação ao primeiro semestre do ano anterior, de 2013, o que por si só já justificaria uma reorganização das despesas públicas. Obviamente com a sua contenção.

O que faz a presidente da República? Ampliou os gastos. Ontem à noite o ministro da Fazenda, a quem eu respeito pessoalmente, fez duas afirmações que eu devo aqui contestar. A primeira delas pelo menos em relação à forma como foi alcançado. Ele fala que os gastos discricionários deste ano estão retornando ao patamar de 2013. É verdade, mas sem dizer como retornou ao patamar de 2013 passa-se a impressão de que o governo está fazendo o que deveria fazer, que é conter as suas despesas. Isso não aconteceu. Porque esse retorno ao patamar de 2013 diz respeito em grande parte ao corte dos investimentos públicos. Até agora, até o início do mês de agosto, foram 19 bilhões de cortes de investimentos públicos, que é o pior dos cortes.

Portanto, o ajuste que se propôs ao Brasil até agora, e é por isso que não há mais confiança em relação ao governo, se dá de um lado pelo corte desses investimentos e pela busca do aumento de tributos, por outro lado. Apenas para que tenhamos uma dimensão clara do que estou dizendo, nos quatro primeiros anos, no primeiro mandato da presidente Dilma, as despesas do governo aumentaram algo em torno de 200 bilhões de reais. Esse foi o aumento das despesas, do conjunto das despesas do primeiro mandato da presidente Dilma. Nesse conjunto, de investimentos públicos federais, o aumento foi de R$ 20 bilhões.

Então, em quatro anos, mesmo num período positivo da economia, ela consegue aumentar os investimentos públicos, aqueles que geram emprego, aqueles que impactam na infraestrutura do país e, portanto, na competitividade da nossa economia, aumentaram R$ 20 bilhões. Dos R$ 200 bilhões apenas R$ 20 bilhões em investimentos. Apenas até agosto deste ano, todo esforço de crescimento do investimento do governo da presidente Dilma, do primeiro mandato inteiro, se foi, foi embora.

E é aí que está o corte do governo. Não há como aceitar que o governo busque cobrar da sociedade brasileira, novamente, a partir de aumento de carga tributária, um esforço que ele não fez, ele não fez internamente. E o ministro disse ontem, se eu entendi bem, que a presidente usou da sua popularidade, ou gastou a sua popularidade, este ano, para tomar medidas corretivas.

Não é verdade. É o oposto. A presidente da República não quis perder popularidade para vencer as eleições e nos colocou nessa crise extremamente profunda que é de responsabilidade exclusiva deste governo.

Em 2008, vocês vão se lembrar, ganhamos grau de investimento da mesma agência Standard & Poor’s. No ano de 2008, quando o mundo vivia uma gravíssima crise, elevamos nosso grau de investimento. Portanto, passaram-se esses anos todos, todo mundo se recupera e o Brasil perde seu grau de investimento. Isso é a demonstração dos equívocos gravíssimos desse governo. E enquanto esse governo não recuperar a confiança, a credibilidade, – e confesso a vocês, não sei se terá mais condições de recuperar – nenhuma medida será efetiva no sentido de retomar o crescimento da economia. Portanto, o que quero reafirmar aqui hoje é que a responsabilidade exclusiva pela situação por que passa o Brasil, que irá se agravar a partir desse rebaixamento da nossa nota, é responsabilidade exclusiva deste governo.


O senhor vai se engajar junto com outros líderes do PSDB nessa campanha iniciada de deputados do movimento pró-impeachment?

Esse é um movimento da Câmara dos Deputados, do conjunto de partidos de oposição, não do PSDB em especial, e ele parte de um pressuposto, de um sentimento da sociedade brasileira de que este governo perdeu as condições de governabilidade. É um movimento legítimo, é um movimento que se sustenta em previsões constitucionais, mas não deve ser um movimento de um partido político, muito menos um movimento do PSDB. É um movimento da sociedade e, enquanto parte da sociedade, os parlamentares do nosso partido, como de outros partidos de oposição, vão participar dele.


Sobre o corte de gastos, o orçamento tem uma previsão de aumento para os servidores de R$ 15 bilhões. O senhor acha que o governo poderia cortar por aí?

Não somos nós da oposição que vamos dizer onde o governo terá que cortar. É o que o governo tentou fazer. A meu ver um gesto de covardia. Não assumiu a sua responsabilidade seja na definição dos cortes que são necessários, seja na definição de outras e novas fontes de receita. O governo quis transferir essa responsabilidade para o Congresso Nacional e aguardamos que ele aponte os caminhos para a busca do equilíbrio orçamentário.

Nós, da oposição, não somos e jamais seremos contra o Brasil. Propostas exequíveis, realistas serão analisadas por nós com todo o interesse e boa vontade, mas não podemos – até porque perdemos a eleição – subir a rampa do Palácio do Planalto e começar a governar. Não podemos fazer aquilo que a presidente não vem fazendo. Enquanto ela estiver lá, é ela que deve governar. E é responsabilidade do governante, daquele que foi eleito, ter desgastes quando for necessário, principalmente desgastes em razão de erros cometidos por eles próprios. Não esperem que seja o Congresso a apontar o caminho dos cortes. Apresentem as propostas. Vamos debatê-las intensamente aqui no Congresso Nacional pensando no Brasil.

E pensando no Brasil, na próxima quinta-feira, estaremos realizando aqui mesmo no Senado Federal ampla discussão com alguns dos principais economistas do PSDB na busca de saídas a partir do diagnóstico sereno, independente e isento que faremos da realidade do país, vamos, com a presença de Armínio Fraga, com a presença de Gustavo Franco, Marcos Lisboa, Mansueto (Almeida), e do Samuel Pessôa, vamos fazer um seminário sobre economia, com a presença também do presidente Fernando Henrique. E começar a apontar caminhos para o país. O governo perdeu até isso, a capacidade de apontar caminhos, de ter um projeto para o país. E essas contradições internas, que são escancaradas a todos os instantes, dentro da própria estrutura do governo, só ajudam a consolidar este sentimento de ingovernabilidade que vivemos no Brasil hoje. E percebo, inclusive em setores privados, de mercado, empreendedores, investidores, grandes empresários, que de alguma forma estavam solidários ao governo, o que percebo é que também vai se esvaindo, vai se perdendo a confiança nesses setores. O governo da presidente Dilma, a meu ver, está por um fio.


A nota da agência cita o elevado risco para a política fiscal a dinâmica fluida do Congresso. O sr. acha que o Congresso também não tem responsabilidade, se não pela crise ter chegado a este ponto, mas pelo andamento da situação?

Quando você vive em um regime presidencialista que é o nosso caso, o governo precisa ter uma base de sustentação em torno de um projeto e amalgamar, construir a sua base de sustentação em torno de um projeto de país. Esse governo não fez. O governo construiu a sua base em cima quase que exclusivamente, na distribuição de favores e de cargos públicos. Portanto, em um momento em que o governo se fragiliza, não há nada que una a sua base. Não há como cobrar da oposição uma responsabilidade que deve ser daqueles que foram eleitos. Estamos prontos a debater qualquer um dos temas que chegam ao Congresso Nacional, igual a uma lei. Em muitos momentos, é aqui mesmo no Senado que temos impedido o avanço de medidas que seriam ruins não para este governo, mas ruins para o país no futuro, para o equilíbrio fiscal, para a possibilidade de retomada do crescimento da economia.

O governo pela forma como agiu, achando que comprava o Congresso Nacional com emendas parlamentares ou como distribuição farta de cargos, viu que se não tiver um projeto de país ele não se sustenta. Tem outro dado extremamente relevante do ponto de vista econômico que teremos este ano de 2015, uma participação do investimento público federal na constituição do PIB de 0,8%. Me lembro que na campanha, quando quisemos tratar este debate, o governo falava em algo acima de 2%. Portanto, o investimento público federal este ano será de 0,8% do PIB. Voltamos ao ano de 2007. Retrocedemos oito anos. Esse é o resultado da obra perversa desse governo do PT. Porque quando tentamos, durante a campanha eleitoral, debater a necessidade de ajustes, falarmos, por exemplo, da necessidade de qualificarmos os subsídios, o governo nos considerava os pessimistas, aqueles que iriam fazer maldades para as pessoas.

A presidente Dilma privou o Brasil de um debate sério em relação a aquilo que precisava ser feito. Vocês se lembrarão da questão dos subsídios que são necessários para determinados, são necessários transitoriamente para outros setores. Fomos acusados de perseguir os setores que mais contribuíam para a empregabilidade no país. No Orçamento de 2016 o Brasil gastará com o Bolsa Família algo em torno de R$ 28 bilhões, que é um investimento importante. Apenas com o pagamento dos subsídios já dados pelo governo, gastaríamos mais R$ 28 bilhões. Em 2010 essa conta era de R$ 8 bilhões.

Aí vocês imaginam o que esse governo fez para vencer as eleições. A conta dos subsídios apenas significa um outro Bolsa Família no Brasil. Com quais resultados? Que ninguém sabe. Esses setores ganharam escala? Empregaram mais? Ao contrário. Estão todos hoje dependentes, cada vez mais, desses mesmos subsídios. O que mais, acho, que me incomoda nesse instante, falo de forma absolutamente franca, é não ter tido a oportunidade porque o governo não aceitou esse debate e ter discutido o que era necessário ter feito nos dois últimos anos porque o custo seria, hoje, muito menor. Inclusive em relação ao rebaixamento da nota do Brasil, talvez não tivesse ocorrido se tivéssemos debatido com a verdade e não com a mentira que conduziu o governo.

O PSDB vai votar contra o aumento de impostos?

O PSDB é contrário, já dizíamos isso na campanha, reiteramos hoje, contra o aumento de carga tributária. E não reconhecemos autoridade em um governo que propõe aumento de carga tributária e que não fez os cortes necessários. Os cortes que o governo fez substancialmente foram nos investimentos. Não cortou até agora na própria carne. E na verdade, esse vai e vem do governo, com propostas que ele lança ao vento para ver se colam, só aumenta o descrédito, só aumenta a incapacidade desse governo de conduzir o Brasil.


O senhor disse que o governo da presidente Dilma está por um fio. O que é preciso acontecer para esse fio se romper?

Estamos vendo o agravamento da crise econômica e o esgarçamento das relações políticas desse governo. Ainda dou uma chance a ele. Digo o seguinte: ou ele assume a sua responsabilidade que não assumiu até agora, por exemplo, apontando ao país, do ponto de vista orçamentário, onde vão ser feitos os cortes, qual o caminho para o incremento de receitas. Mas o governo se acovarda. Temos hoje uma presidente sitiada e um governo que, na verdade, não governa mais.

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