Um ano sem Itamar

Itamar não foi um político comum, talvez mesmo porque preferisse ser sempre visto como homem comum. Engenheiro, ele foi atraído pela vida pública ao trabalhar em saneamento, tanto para o Departamento Na­cional de Obras contra as Secas (Dnocs), quan­to para a Prefeitura de Juiz de Fora. Ao ver, de perto, o sofrimento dos moradores das áreas castigadas pela estiagem e a população da peri­feria de sua cidade, ltamar entendeu que a solidariedade necessita de poder, para que pos­sa ser plenamente exercida. Foi assim que se tornou vereador, prefeito de sua cidade, sena­dor, vice-presidente e presidente da República, governador de Minas e, mais uma vez, e por poucos meses, novamente representante de nosso Estado no Senado Federal.

Ele tinha a nítida consciência da autoridade que exercia, em nome de seus eleitores, mas não se deixava enlevar pelos ritos circunstanciais do poder. Nisso, ele seguia o evangelho político dos mineiros, que costumam ser corteses no relacio­namento social e político, mas severos na defesa do interesse público. Itamar não se conduzia pe­las conveniências do momento, e expunha suas posições políticas com absoluta franqueza. Isso lhe trouxe algumas dificuldades menores, mas assegurou a solidez de sua biografia.

Fomos aliados firmes, durante os seus últi­mos anos de vida. Tive o privilégio de herdar a relação leal que ele sempre manteve com meu pai, Aécio Cunha, durante quase toda a vida.

Havíamos nos distanciado, e foi natural que isso ocorresse, nas eleições de 1989, quando ele se candi­datou a vice-presidente na chapa de Fernando Collor, e eu mantive a minha fidelidade ao PSDB e ao nosso candidato Mário Covas. Mas é preciso reconhecer que se Itamar não tivesse, como vice-presidente, assumi­do a chefia do país, naquelas circunstâncias difíceis, com a crise de confiança no governo, o desfecho poderia ter sido outro, e muito grave.

Com modéstia, senso comum, e o inexcedível zelo para com o patrimônio público, Itamar recuperou, em poucas horas, a confiança nacional nas institui­ções, organizou um governo coeso e, com coragem, assumiu os riscos necessários, sobretudo na decisão de realizar reforma monetária ousada, imposta pela necessidade de interromper processo hiperinflacio­nário que nos teria levado ao caos econômico e, provavelmente, à insegurança política.

Nos reencontramos em 2002, quando ele me convocou a assumir a candidatura a governador de Minas. E a partir de então, estabelecemos uma convivência de respeito e amizade que me marca­ria de forma definitiva.

Por onde passou, Itamar deixou aos brasileiros diferentes legados. O principal deles é que não há incompatibilidade entre política e ética; política e honestidade; política e honra.

Share on FacebookTweet about this on TwitterShare on Google+