Pronunciamento de Aécio Neves durante homenagem a Tancredo Neves – 27-10-21

Câmara dos Deputados – 26-10-21

Sr. presidente, deputado general Peternelli; Sras. e Srs. parlamentares, é com uma alegria imensa que subo hoje a esta tribuna. Quantas vezes, ao longo da minha vida parlamentar, tive o privilégio de sentar na cadeira que V.Exa., com muita honradez e dignidade, ocupa hoje; de ocupar as duas tribunas do Plenário, defendendo as causas que eu acreditava que eram as melhores para o país. Mas hoje tenho um sentimento diferente, deputado General Peternelli, e agradeço a generosidade de V.Exa. de aguardar essa minha palavra já no encerramento desta sessão.

Eu aprendi muito cedo que é triste o povo que não conhece a sua história, pois esse mesmo povo terá uma dificuldade imensa de construir o seu futuro. A Câmara dos Deputados do Brasil, deputado Paulo Abi-Ackel, deputado e líder Rodrigo de Castro, deputado Eduardo Cury, permite, a partir da homenagem que se faz ao ex-presidente Tancredo Neves, ao transformá-lo em Patrono da Redemocratização, que os brasileiros das novas gerações compreendam as etapas que vencemos, os obstáculos que superamos e que nos trouxeram até aqui, e os valores democráticos pregados por Tancredo e por tantos outros.

Essa não é, caríssimo presidente, homenagem que se faz a um homem, a um cidadão, por mais que ele, pela sua trajetória política e pessoal, as mereça. Ao transformar Tancredo em Patrono da Redemocratização, a Câmara dos Deputados do Brasil homenageia uma geração de brasileiros que soube, com tenacidade, mas com paciência, construir o caminho que nos permitiu trilhar o das liberdades e da democracia. De lá para cá, tivemos inúmeros desafios a serem superados, mas, em nenhum momento, assistimos à democracia em risco. As nossas instituições democráticas se solidificaram ao longo do tempo e permitem que a alternância do poder se dê da forma mais cristalina e tranquila possível.

Digo isso, Sr. presidente e líder Rodrigo de Castro, porque esses valores essenciais da democracia deverão ser sempre o nosso norte, deverão ser o pilar absolutamente fundamental e definitivo para superarmos também as eventuais dificuldades por que passamos, enxergando sempre o futuro.

Tancredo era um pacificador, mas era um homem de coragem. Sabia enfrentar aqueles que deveria enfrentar, mas sabia estender a mão, colocando sempre em primeiro lugar o interesse maior da sociedade brasileira em todos os momentos da sua vida. Como Ministro da Justiça de Getúlio, foi firme ao defender a constitucionalidade numa reunião ministerial tão famosa para aqueles que conhecem a história do Brasil, dispondo-se a prender o Ministro do Exército. Tancredo foi o homem do entendimento enquanto Primeiro-Ministro, para permitir uma transição entre o regime presidencialista e o regime parlamentarista.

Tancredo, ao retornar a seu Estado, Minas Gerais, e governá-lo, sabia sua missão era muito maior. Ele disse uma frase, deputado General Peternelli, que guardo comigo com muita força, que se faz muito presente na minha história pessoal e que serve para todos nós que nos dedicamos à política. Ele disse: “Para aventuras não contem comigo, mas para correr riscos, quando eles vêm em favor da sociedade que nós representamos, é inerente à nossa atividade”. E foi correndo riscos que ele se elegeu presidente da República, neste mesmo Plenário que sediou o colégio eleitoral. E foi exatamente correndo riscos em relação à sua própria vida que ele garantiu que a transição, o episódio da transferência do poder militar para o civil se desse sem traumas, sem derramamento de sangue. Era, sim, o homem da conciliação.

Acompanhei-o na sua primeira viagem pelo mundo apresentando às principais democracias do Ocidente o Brasil democratizado. O Brasil era recebido com respeito, o Brasil era recebido com reverência.

E ele tinha a noção clara de que a sua missão maior era permitir a consolidação da transição democrática. Certamente não foi feliz, mas foi em paz, sabendo que a maior das missões da sua vida tinha sido concluída com êxito.

Que saibamos nós, Sr. presidente, Sras. e Srs. parlamentares, honrar a sua história e a de tantos outros brasileiros, como Ulysses Guimarães, como Teotônio Vilela, como Leonel Brizola, como José Richa, como Montoro, como Mário Covas e tantos outros que ao seu lado conseguiram fazer com que a nossa transição se transformasse em algo exemplar para a nossa região, onde as rupturas se davam de forma extremamente traumática!

Venho aqui, portanto, para reconhecer e agradecer aos Srs. parlamentares a generosidade desse gesto, mas também para pedir que ele sirva de reflexão, de norte e de bússola para que não nos afastemos das nossas convicções democráticas em momento nenhum da nossa história. Que saibamos ultrapassar as nossas dificuldades e fazer o contraditório, respeitando as nossas instituições e o maior dos legados que nos deixou Tancredo e toda a sua geração.

Foi daí, presidente Peternelli, da cadeira em que V.Exa. hoje está sentado, que ele trouxe a sua última mensagem ao Congresso Nacional no dia da sua eleição. E é com emoção que me lembro daquele momento. Vejo em V.Exa. uma feliz coincidência do destino, pois V.Exa., militar respeitado que é e que por esses desígnios do destino hoje preside esta sessão, serviu na São João del-Rei, tão querida, do presidente Tancredo e certamente lá ouviu muitas das suas histórias.

E termino essa minha mensagem aos brasileiros lembrando o amor que ele tinha por sua terra e que V.Exa., presidente, aqui também me lembrava. No último sábado, eu estive em São João del-Rei e, mais uma vez, num gesto solitário, num final de tarde, fui visitá-lo e vi ali novamente aquela mensagem que ele havia me pedido para guardar no bolso, para que, no dia em que ele faltasse, ela estivesse transcrita em seu túmulo. E aquela mensagem, que encontrei e fiz com que ali fosse transcrita, está lá até hoje e diz: “Ó, terra minha, amada querida, tu terás os meus ossos, que serão a última identificação do meu ser com este rincão abençoado”.

Tancredo amava sua terra São João del-Rei, amava Minas, que governou e a que se dedicou durante toda a sua vida, mas era acima de tudo um brasileiro generoso, capaz dos maiores sacrifícios possíveis para que nós pudéssemos hoje viver em plena democracia. Que nós tenhamos a capacidade de fazê-la perene para as próximas gerações.

Muito obrigado, Presidente.

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