Folha de São Paulo 16/04/2018
A narrativa que se impõe como um tsunami no país tende a considerar, de antemão, todos os políticos culpados.
Fragmentos de imagens e manchetes repetidos à exaustão definem percepções. Vivemos o tempo da opinião muitas vezes desvinculada da informação.
Sou alvo de denúncia em função da delação da JBS. Aos que não conhecem o seu conteúdo, ofereço este esclarecimento. Ofereço mais, ofereço os fatos.
No início de 2017, precisei contratar advogados. Era uma despesa inesperada e eu não possuía recursos pessoais para enfrentá-la. Minha mãe colocou então à venda o apartamento em que reside há mais de 35 anos no Rio de Janeiro.
Minha irmã, Andrea, ofereceu o imóvel a alguns empresários, inclusive ao senhor Joesley Batista. Ela teve com ele, em toda a sua vida, um único encontro, a meu pedido, motivado por esse assunto familiar que nada teve a ver com política.
Mais tarde, de passagem pelo Rio, ela lhe telefonou, convidando-o para conhecer o imóvel. Ele preferiu não ir e pediu um encontro comigo.
Felizmente, esse telefonema, omitido pelo delator, foi recuperado pela Polícia Federal. Ele mostra, de forma inequívoca, o objetivo do contato feito: a venda do imóvel. Apesar da relevância, essa informação não foi mencionada na denúncia.
Recebi, de boa-fé, o delator no hotel em que estava e, numa conversa criminosamente gravada e induzida por ele, permiti-me usar um vocabulário inadequado e fazer brincadeiras injustificáveis e de enorme mau gosto, das quais me arrependo profundamente. Lamento, especialmente, o que esse episódio acarretou para outras pessoas.
Meu primo, Frederico, é uma pessoa absolutamente correta, íntegra e não tem nenhuma responsabilidade pelos fatos ocorridos. Limitou-se a me fazer um favor ao receber um empréstimo pessoal, a mim dirigido, que não tinha nenhuma vinculação com o cargo que ocupo. Reitero a ele e ao seu amigo Menderson, que o acompanhou, o meu pedido público de desculpas pelas consequências que eles e suas famílias vêm sofrendo.
Minha irmã, reconhecida até mesmo pelos meus adversários por sua seriedade e correção, foi injusta e covardemente exposta apenas por ter contatado o delator com a intenção de vender um imóvel.
Na gravação de que fui alvo, o delator atesta a origem lícita e particular dos recursos e deixa claro — também em depoimento— que partiu dele a decisão de que o empréstimo teria que ser feito em espécie, o que não é ilegal, uma vez constatada a licitude dos recursos.
Errei em aceitá-lo. Mas não cometi nenhum crime. Não houve nenhum prejuízo aos cofres públicos. Ninguém foi lesado.
Hoje, é fácil reconhecer que o objetivo dessa exigência era gerar as imagens para o seu extraordinário acordo de delação. Os recursos ficaram guardados, esperando serem formalizados, para que eu pudesse pagar honorários de advogados. Como isso não ocorreu, não foram usados e foram entregues à Justiça.
Mas vamos às acusações.
Sou acusado de corrupção passiva, crime que pressupõe que um agente público receba vantagem indevida em troca de contrapartida.
Não houve vantagem indevida, e a própria Procuradoria-Geral da República indicou que não houve nenhuma contrapartida no caso.
Na gravação, poucos se recordam de que rechacei prontamente a sugestão, feita por ele, para que apoiasse um nome para a presidência da Vale. A menção a diretorias da empresa se deu como forma de encerrar o assunto introduzido, premeditadamente, por ele. Prova de que essa questão nem sequer foi considerada é que absolutamente nenhuma iniciativa foi tomada nesse sentido.
Na minha vida pública, não existe um ato sequer em favor da JBS, o que foi confirmado pelos delatores.
Como falar em corrupção onde não existe dinheiro público ou contrapartida?
A segunda acusação, de tentativa de obstrução, é também desprovida de fundamento.
Basta dizer que o precedente citado em longas 15 páginas para justificar a denúncia contra mim foi arquivado pelo Supremo Tribunal Federal, a pedido da própria PGR. Ou seja, pelos critérios da própria instituição eu não deveria nem sequer estar sendo denunciado.
Acusam-me por votos que dei no Senado e por opiniões que externei em conversa particular, sem que tivessem nenhum desdobramento fático. Tenta-se, com isso, criminalizar opiniões e votos de congressistas cujas imunidades são garantidas pela Constituição. De forma seletiva, a denúncia ignora, por exemplo, que cheguei a apresentar emenda alterando o projeto original da Lei de Abuso de Autoridade, defendendo, justamente, o ponto de vista do Ministério Público Federal!
É, portanto, com o sentimento de grande impotência que vejo as versões devorarem os fatos.
O que me define são os meus 32 anos de vida pública honrada e não os poucos minutos de uma armadilha montada por criminosos.
Fui ingênuo, cometi erros e me penitencio diariamente por eles. Mas não cometi nenhuma ilegalidade.
Por isso, não esmoreço. Em nome da minha história, da minha família e de todos aqueles que confiaram a mim a esperança de uma Minas Gerais e de um Brasil melhor, sigo em frente, porque sei que a verdade vai prevalecer.
Apesar do tsunami.
Artigo publicado na Folha de S.Paulo – 16/04/18