Aécio Neves, Jornal Estado de Minas, 2 de abril de 2016
A presidente da República, o PT e os aliados do atual governo prestam um enorme desserviço à Nação ao comparar a luta atual contra a corrupção e a favor do impeachment com o movimento golpista que há 52 anos tomou o poder e nos impôs um longo período de trevas. Esta é uma farsa grotesca contra a qual é preciso reagir.
Não há como comparar os idos de 1964 com o estado de normalidade democrática que vivenciamos hoje. Ao adotar a estratégia de terror para assustar a Nação e ameaçar a oposição, sustentada em uma retórica cada vez mais incendiária, a presidente atropela a história, incita a intolerância e afronta as instituições que zelam pela democracia.
O Brasil vive um momento de inquietação política que requer serenidade de todos nós. Os ânimos estão acirrados, sem dúvida. No entanto, devemos reconhecer que as instituições permanecem sólidas, funcionando em sua plenitude. Em respeito à memória histórica, lembremos que em 1964 houve uma clara ruptura institucional. Ou seja, o discurso do golpe já nasce contaminado pela mentira.
Os juristas Miguel Reale Jr., ex-ministro da Justiça, e Janaína Paschoal, autores do pedido de impeachment da presidente, em audiência na Câmara, semana passada, sustentaram que sobram crimes de responsabilidade capazes de justificar a interrupção do mandato presidencial. Citaram as manobras fiscais que infringiram gravemente e de forma continuada a Lei de Responsabilidade Fiscal, os ilícitos orçamentários e a omissão não explicada da chefe de Estado frente ao maior esquema de corrupção da história do país, que sangrava a nossa principal estatal.
Infelizmente, os fatos corroboram a afirmação feita por Janaína de que “a responsabilidade fiscal não é um valor para este governo”. Um governo que abusou de artifícios fiscais à revelia dos procedimentos fixados pela Constituição e promoveu um ataque frontal aos alicerces da Lei de Responsabilidade Fiscal, este verdadeiro patrimônio institucional do país. É contra este abuso de poder que precisamos reagir. Golpe mesmo foi a fraude eleitoral protagonizada pelo governo, ao criar na população o sentimento de que existia uma segurança financeira e fiscal para cumprir todas aquelas promessas de campanha. Já era sabido pela presidente candidata que ela que não teria como cumpri-las. Mentiram sabendo que mentiam.
Os brasileiros que acreditaram nas quimeras de campanha hoje enfrentam a duríssima realidade de inflação alta, desemprego galopante, enfraquecimento dos programas sociais e uma profunda recessão. Os mineiros sabem isso.
Lutar contra este estado de coisas e apontar os crimes de responsabilidade ocorridos não é pregar um golpe, muito ao contrário. Não existe golpe quando se cumpre a Constituição. Não existe golpe quando o Supremo Tribunal Federal avaliza e determina o rito a ser seguido. Apenas nos regimes totalitários há salvo-conduto para um governante.
No ambiente atual, não existe qualquer ameaça de ruptura institucional. Quem quer desestabilizar a normalidade democrática e colocar em suspeição o trabalho das instituições republicanas são os arautos deste falso golpe. Este sim, um atentado contra o Estado de Direito que a sociedade brasileira construiu tão duramente ao longo dos últimos anos.