Aécio Neves – Entrevista sobre Reforma Política

Em entrevista, o senador Aécio Neves falou sobre a proposta de Reforma Política enviada pela presidente Dilma ao Congresso

Brasília

 

É absolutamente inviável do ponto de vista prático e uma matéria diversionista. A presidente da República quer dizer aos brasileiros que aquilo que os levou às ruas foram as propostas que interessam ao PT na reforma política, e não a calamidade da saúde pública, a falência da mobilidade urbana, em especial o transporte público, o aumento da criminalidade.

Mais uma vez o governo mostra que não entendeu absolutamente nada que a população brasileira quis dizer. Nós da oposição apresentamos uma proposta à presidência da República. Questões pontuais como, por exemplo, até do ponto de vista simbólico, acabar com metade desses ministérios que atendem apenas aos companheiros. Acabar com metade dos 22 mil cargos comissionados para dar um exemplo ao Brasil. Enterrar o projeto do trem bala que custará R$ 50 bilhões, investindo esses recursos nos metrôs das principais centros urbanos. Garantir os 10% dos recursos para a saúde. Garantir os 10% do PIB para a educação. São essas as respostas que o Brasil clama.

A presidente da República acorda de um sono profundo e apresenta ao Congresso alguns temas de reforma política que, se necessários são, e eu concordo que são, não respondem às demandas da população brasileira. Na verdade, o que a presidente busca fazer é convidar o Congresso Nacional para um passeio de primeira classe numa cabine do Titanic.

Portanto, nós aqui estamos denunciando: o governo federal não quis conversar com as oposições e, achamos que agora não há também nenhum sentido maior nessa conversa, porque nós apresentamos ao Brasil uma agenda. Uma agenda objetiva. A presidente me parece não gosta do diálogo. Prefere o monólogo. E, para isso, fez uma reunião com governadores e prefeitos, constrangendo a todos, porque apenas ela falou. Fez outras reuniões com setores da sociedade já cooptados, boa parte deles pelo governo com verbas públicas, e acha que está dando alguma resposta à sociedade. Não está. Nosso papel é denunciar. A agenda que interessa ao Brasil, mais uma está sendo adiada pelo governo.

 

Dá para impedir ou barrar esse plebiscito?

O erro tem uma velocidade própria. E esse é um grande erro. Acredito que não caminhará pela sua inviabilidade. Querer que temas como esses sejam discutidos com 15, 20 dias de propaganda, temas extremamente complexos, é, na verdade, tirar o foco da questão central.

A agenda da reforma política, ela é necessária, hoje mesmo cobrei do presidente do Senado Federal que coloque em pauta um projeto aprovado na Comissão de Justiça da Casa que garante que todas as propostas de reforma política e eleitoral sejam submetidas a referendo. E que esse referendo ocorra no dia da eleição, no ano que vem.
Isso que é o razoável, isso é o correto, isso é respeitar a população brasileira. Acho que a proposta que chega aqui hoje no Congresso Nacional é um desrespeito aos milhões de brasileiros que foram às ruas clamar por saúde, por educação, por segurança, por mobilidade e, principalmente, por respeito.

 

Em relação ao sistema do plebiscito, faltou algum tema a ser apresentado?

É claro que aqui no Congresso esses temas vão ser ampliados, as questões são inúmeras. A questão do mandato de 5 anos sem reeleição, a própria questão do sistema parlamentarista de governo. Portanto, essas são questões que devem ser decididas e votadas pelo Congresso. A presidente tem uma maioria espantosa no Parlamento. Bastasse dizer, e ela não disse ainda, o que acha sobre cada um desses temas, tentar direcionar, ou negociar, com a sua base a aprovação desses temas pelo Congresso e depois submetê-los a um referendo.

Mas, enquanto isso, os brasileiros continuam aguardando. Onde estão os investimentos em segurança contingenciados ano a ano pelo governo? Onde está a vontade política de aumentar o financiamento da saúde que, nos últimos dez anos, diminuiu muito no Brasil?  Onde está a vontade política de garantir que Plano Nacional de Educação seja cumprido, com 10% do PIB em educação? Não vi nenhuma resposta da presidente da República à agenda das oposições.

As oposições, nas últimas eleições no primeiro turno, somadas, venceram as eleições. Com os votos de Marina Silva e José Serra. No segundo turno, José Serra teve 44% dos votos dos brasileiros. A presidente da República, vir a público, falar em um grande pacto sem convidar a oposição para dialogar e apresentando, aqui já, algo pronto e acabado, é um desrespeito para com metade da população brasileira, que, inclusive, nos estados, já é governada por governadores da oposição, em especial do PSDB. Acho que é mais um gravíssimo equívoco do governo federal, que parece que não entendeu absolutamente nada do que veio das ruas.

 

A presidente tinha avisado que ia convidar a oposição para conversar e acabou não fazendo.

Recebi um telefonema quarta-feira da semana passada do presidente Renan, dizendo que a presidente gostaria de nos ouvir e perguntando qual era a nossa disposição. Disse que, em torno de uma agenda que havíamos acabado de apresentar, como cidadãos brasileiros, devíamos estar à disposição desse diálogo. Não para tirar uma foto, como tantas que ela tirou. O que vejo é que até nisso há uma insegurança grande no governo. O presidente Henrique [Eduardo Alves] também comunicou alguns líderes de oposição, o presidente da Câmara, que seriam convidados, e perdeu sentido essa conversa.

O que percebemos é que ela prefere o monólogo, prefere a foto, prefere o encaminhamento do marqueteiro oficial do que ouvir as oposições, que representam praticamente metade da população. Aliás, hoje, pelas últimas pesquisas, já representam bem mais que metade da população.

 

Dá tempo de fazer o plebiscito e aprovar todas as regras ainda para valer em 2014?

A questão da anualidade é uma cláusula pétrea da Constituição. Qualquer transformação, modificação no processo eleitoral, tem que ser aprovada com um ano de antecedência. Por quê? Isso é uma defesa, uma salvaguarda das minorias, para que elas não sejam atropeladas às vésperas do processo eleitoral por uma maioria circunstancial. É inviável, absolutamente impossível. E, no fundo, acredito que a própria presidente da República sabe que isso é impossível, mas ela prefere trazer esse tema para o Congresso, fazer com que aqui haja um enorme debate, como se as pessoas esquecessem da realidade, daquilo que as aflige. Infelizmente, não houve até aqui nenhuma resposta pontual do governo federal.

Confesso a vocês que, pessoalmente, ao saber que a presidente se reuniria com seus quase 40 ministros no dia de ontem, achei que ia ter a visão clara dela em relação à impossibilidade de se governar com aquele número de ministros. Não sei nem se ela os conhece a todos. Seria o momento de ela dizer: olha, metade do que estão aqui, eu agradeço a contribuição, mas não precisamos mais que vocês gastem o dinheiro público. Isso não aconteceu. Infelizmente, a presidente da República não fez um mea culpa, não admitiu um equívoco sequer.

Daqui a pouco vai ter alguém do PT para dizer que a culpa de tudo de errado, dos desvios, da carência de infraestrutura que ocorre no Brasil, é responsabilidade do povo, e não do PT, que nos governa há mais de dez anos.

 

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