Local: Brasília – DF
Assuntos: renegociação da dívida dos estados com a União, Pacto Federativo, Guerra dos Portos
Sobre proposta apresentada pelo senador para mudar o indexador da dívida dos estados com a União.
Essa é uma questão que une o País. Vivemos hoje um momento de fragilização absoluta da federação. O Brasil caminha quase para se transformar em um Estado unitário, com poder absoluto nas mãos da União. E a renegociação das dívidas, que em 1997 foi adequada, porque aliviou os pagamentos dos estados, hoje, não é mais adequada. Hoje, a União é rentista dos estados. Para se ter uma ideia, os estados, hoje, pagam a União a juros muito maiores do que o BNDES, por exemplo, empresta para o setor privado. Isso não se justifica. Portanto, o que queremos é uma negociação que alivie o espaço fiscal para os estados voltarem a investir em segurança, voltarem a investir em infraestrutura, voltarem a investir em educação, em saúde. Portanto, há o início de uma discussão, pelo menos houve um sinal do governo de que admite essa discussão. E apresentamos uma proposta que além de mudar o indexador para aquele que seja menor – IGP-DI ou IPCA –, porque em determinado momento, em função da questão cambial, o IGP-DI, lá atrás, foi mais favorável, mas durante 15 anos foi desfavorável aos estados. Além de estabelecer que valerá o menor indexador, aquele que for mais vantajoso para os estados federados, não podemos permitir que as receitas sejam comprometidas no limite em que ocorre hoje. Hoje, em alguns estados, até 15% das receitas são comprometidas para o pagamento do serviço da dívida com a União. Queremos estabelecer esse patamar em no máximo 9%. Os estados continuarão pagando à União, mas esse espaço entre 9% e 15%, em alguns estados 13%, servirá para que os estados voltem a investir. Essa discussão está madura, ela precisa ocorrer nessa Casa, no Senado Federal, que é a Casa da Federação, e esperamos que o governo compreenda que não é bom nem para a União ter estados e municípios tão fragilizados como temos hoje.
O senhor acha que é necessário um novo Pacto Federativo?
Essa é a nossa bandeira de muitos anos. Desde que assumi o Governo de Minas venho debatendo pela renegociação do indexador das dívidas. Não é justo que os estados, que têm que prover a segurança, a educação, a saúde, pague juros maiores do que o setor privado para determinados investimentos que nem resultados dão. Investimentos que não agregam renda, muitos deles não agregam sequer empregos no País. Portanto, o que queremos é algo que seja justo e que vai, de alguma forma, fazer parte de um conjunto de medidas que passam pelos royalties, com a sua nova distribuição, os novos critérios para distribuição do FPE, essa própria regulamentação do projeto de resolução n° 72, que acaba com os incentivos para as importações, além dessa questão específica da renegociação das dívidas, esse conjunto de medidas poderá acender uma luz no final do túnel para que o Brasil volte a viver numa Federação. Hoje, Federação é uma expressão vazia, solta numa folha de papel, sem qualquer conexão com a realidade.
Senador, por que o senhor diz que o governo federal tem um comportamento que assusta?
O governo federal não agiu até agora no sentido de refundar ou fortalecer a Federação. E acha que pode impor quaisquer que sejam suas vontades ao Congresso Nacional. Não é bom para a democracia um Congresso tão subserviente quanto esse, que se acomoda e se satisfaz em aprovar as medidas provisórias enviadas pelo governo. Hoje, estabeleceu-se a indústria do contrabando no Congresso Nacional. Os parlamentares não têm mais sequer o trabalho de propor iniciativas através de projetos de lei que sejam discutidos nas comissões e depois em plenário. Eles buscam uma carona nas medidas provisórias aprovadas pelo governo e a base aceita isso de forma absolutamente subalterna. Isso é ruim para a democracia. E mesmo em relação à dívida dos estados, uma demanda dos estados federados, de governadores de todos os partidos, o governo, sem qualquer discussão com os governadores, envia sua proposta de que esse indexador poderia ser a Selic. É algo absurdo. Seria o primeiro caso na história do mundo em que o credor estabelece, unilateralmente, o indexador pelo qual o devedor irá pagar sem qualquer discussão prévia. Portanto, essa é uma questão que me parece madura na Casa e é preciso que, sobretudo, a base do governo, parlamentares da base do governo, tenham compromisso com seus estados e com o fortalecimento da Federação. E que o governo federal, é a nossa expectativa, permita que essa discussão aqui se dê sem uma camisa-de-força, sem uma pressão excessiva sobre os parlamentares da base. Apresentamos essa proposta, algumas outras estão em tramitação. Existem várias propostas de vários senhores senadores, o que precisamos é ter firmeza e coragem para colocá-las em votação e aliviar o caixa dos estados e dos municípios brasileiros.
Mas essa alteração do indexador vai se dar através da mudança da Lei de Responsabilidade Fiscal ou de um projeto de resolução?
Não há comprometido no escopo da lei. Há uma interpretação dos principais juristas que participaram da elaboração da Lei de Responsabilidade Fiscal que a mudança do indexador não compromete o conjunto da lei. É apenas uma readaptação de algo que em um determinado tempo foi adequado para os estados e, hoje, é absolutamente sufocante para os estados. Muitos estados, hoje, vivem para custear a máquina pública e pagar salários, o que não é justo e não é adequado. Por isso, aquilo que eu disse que é posição do governo, em querer assumir a responsabilidade pelo desenvolvimento de todas as regiões e de todos os estados, assusta aqueles que preferem acreditar no fortalecimento da Federação. Lembro que Rui Barbosa, quando da proclamação da República, dizia que era republicano, que o Império ruíra, não por ser Império, mas por não ser Federalista, por ser concentrador nas suas decisões e na arrecadação. E estamos percebendo no Brasil esse caminho inverso. O Brasil caminha pra viver, infelizmente, um Estado unitário, criando inclusive um certo temor nos estados mais fracos, que passam a depender inclusive para o custeio da sua máquina das bondades do governo. O Brasil não precisa de um governo que faça favores, que faça bondades setoriais, como assistimos nesse último pacote da indústria. Precisa de um governo que cuide das questões estruturais, que tenha um projeto de desenvolvimento realmente nacional, que enfrente essa questão como um todo, não atendendo àqueles que mais demandam.
Sobre a Guerra dos Portos.
Todos nós concordados que há uma competição predatória no momento em que há um estímulo à importação de produtos acabados que competem, obviamente, com produtos produzidos no Brasil e que aqui geram empregos. Mas isso tem que ser feito com uma transição, com uma compensação para esses estados que incorporaram, alguns deles há mais de trinta anos, na sua política econômica, na sua política de desenvolvimento, esses instrumentos. Há uma… se não um consenso, pelo menos uma maioria sólida dos senhores senadores que compreendem que este instrumento tem que acabar, mas, ao mesmo tempo, há um consenso de que isso não pode ser feito como propõe o governo do dia para a noite. Alguns estados não podem prescindir, de um ano para outro, de 10% até 12%, 13% da sua receita. Por isso, apresentei uma proposta que me parece o caminho adequado, racional para essa transição que ao mesmo tempo acaba com esse subsídio que vem sendo dado às importações de produtos acabados, mas permite que estes estados não percam, durante os próximos anos, as suas receitas. O que estamos propondo é que seja, a cada ano, aferida a perda havida no ano anterior em razão do fim desse privilégio, dessas isenções, e essa perda seja compensado no serviço da dívida. Os estados deixariam de pagar, após feita essa contabilidade via Confaz, o estado deixaria de pagar no ano subsequente no serviço da dívida, as parcelas que haviam no valor que estarão perdendo, por um prazo de cinco anos. Depois deste prazo de cinco anos ele se adapta à nova realidade econômica, inclusive de desenvolvimento local. Essa me parece uma contribuição correta. Depende do governo federal. Se mais uma vez virar as costas para a federação, teremos estados cada vez mais dependentes da União. Vai ver que é isso, em determinados momentos nos parece que é isso, que o governo federal prefere: estados fragilizados, com pires na mão, dependendo de favores, dependendo das bondades do governo federal.