Tancredo

Artigo do senador Aécio Neves – Jornal Folha de S. Paulo – 18/01/2015

 

Completamos na última semana 30 anos da eleição de Tancredo para a Presidência da República. Não são poucos os brasileiros que se lembram do significado daquele momento. Depois de uma campanha que mobilizou todo o país, ao lado de outros grandes compatriotas, Tancredo conduziu o Brasil ao reencontro com a democracia.

Naqueles dias, nosso país teve uma felicidade: pôde contar com homens públicos à altura dos desafios que se impunham. Homens para quem a atividade política era um instrumento para servir ao povo e ao país. Hoje, diante do descalabro da política brasileira, palavras como essas soam demagógicas e falsas. Mas sei que no coração de muitos de nós paira a mesma perplexidade: por que nos apequenamos tanto como classe política?

Minha memória daqueles dias não se fixa apenas na força das palavras de Tancredo Neves, na alegria de milhares de pessoas em tantas praças do país, nos sinos que tocaram em São João del Rei naquele 15 de janeiro de 1985. Lembro-me da sua voz embargada, da emoção escondida no seu olhar.

Em seu discurso, citando o poeta francês Paul Verlaine, disse: “Entre o êxtase e o terror de ter sido o escolhido, me entrego hoje ao serviço da nação”. Muitas vezes há quem perca de vista a dimensão humana e pessoal de cada um de nós que ocupamos uma função pública.

Naqueles dias, eu morava com Tancredo em Brasília. Na véspera da eleição no Colégio Eleitoral, tarde da noite, fui até a sala onde o encontrei dormindo na poltrona com os jornais do dia no colo. Ele havia adquirido o hábito de só lê-los à noite. Talvez para evitar a tentação de responder a algum comentário ou se distrair com alguma informação irrelevante para a sua estratégia.

Tirei os seus óculos. Guardei os jornais e, antes de acordá-lo para que fosse descansar melhor no quarto, tentei imaginar a emoção que deveria estar tomando conta dele naquele momento.

Naqueles últimos meses acompanhei dia e noite aquela que se transformou na bela articulação política que permitiu a construção das condições para que o país encerrasse o ciclo autoritário e se reencontrasse com a democracia tão esperada. Olhando de longe, tudo parece mais fácil do que realmente foi.

Com dedicação e paciência, bravos brasileiros construíram pontes que nos permitiram deixar para trás o nosso passado.

É claro que nem todos pensavam da mesma forma. É claro que havia divergências. Mas havia confiança. Havia entre eles respeito pela palavra dada e pelo compromisso assumido. E havia algo maior, comum a todos aqueles líderes: um profundo amor pelo Brasil e a percepção sincera de que os brasileiros eram mais importante que qualquer um deles.

Por isso, consensos puderam ser construídos e o país pôde avançar. Naqueles dias, “interesse nacional” não era apenas uma expressão perdida em um discurso.

Recordo-me que após a eleição, já como presidente eleito, Tancredo viajou ao exterior com um grupo pequeno de pessoas. O objetivo da viagem era tornar irreversível o processo de democratização do Brasil. Dirigentes dos países democráticos visitados percebiam o significado estratégico da iniciativa de Tancredo e o recebiam e saudavam como chefe de Estado, dando sua contribuição à luta de tantos brasileiros. Porque a política também é feita de simbolismos.

Hoje penso naqueles dias. Em tudo que pude testemunhar e aprender. E, com imensa saudade, como brasileiro, manifesto o meu profundo reconhecimento àqueles homens que não faltaram ao Brasil. Que a memória deles encoraje a consciência de cada um de nós que escolheu a vida pública e não nos deixe esquecer que, mesmo não sendo fácil, às vezes, precisamos apenas ter a coragem de fazer o que precisa ser feito. É simples assim.

Cada geração tem o seu compromisso com a história. Precisamos honrar o nosso como eles honraram o deles. Que Deus guarde cada um desses grandes brasileiros.

 

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Trinta anos depois de Tancredo

Artigo do senador Aécio Neves – Revista Isto É – 17/01/2015

 

Há 30 anos, o Brasil virava a mais importante página da sua história política contemporânea, reencontrando-se com a tão buscada democracia. O marco é o já distante ano de 1985, quando foi escolhido para o comando do País o primeiro presidente civil e de oposição após a longa noite de duas décadas de regime de exceção imposto pelo golpe militar de 64.

Tancredo chegou à Presidência através do Colégio Eleitoral, a única via possível naquele momento e que representava o caminho mais curto e seguro para a restauração das liberdades no País. Construtor de pontes em sua essência, ele guardava clara consciência do enorme passo que o Brasil finalmente poderia dar. A derrota das Diretas no Congresso Nacional havia frustrado milhões de nós, mas não paralisou as grandes lideranças com que o País pôde contar naquele difícil trecho da história. Surpreendendo aqueles que acreditavam que a derrota da Emenda Dante de Oliveira significaria também o fim do sonho e a derrota do povo brasileiro, grandes líderes políticos, munidos de um profundo amor pelo Brasil, continuaram perseverantes na jornada de conduzir o País à democracia. E se prepararam para vencer a luta no campo, e com as regras ditadas pelo adversário, no caso o Colégio Eleitoral.

Hoje, adensa-se a percepção de que nunca houve tanta convergência no Brasil como naquela hora histórica. Isso, apesar de o PT, que se recusou a votar em Tancredo, chegando a expulsar  três parlamentares  que, entre os interesses do Brasil e os do partido, escolheram  caminhar ao lado dos brasileiros e deram seus votos ao mineiro. Com unidade  política construída em torno do essencial, os líderes de então cumpriram o seu dever e nos legaram a grande lição: a verdadeira política serve aos interesses do País e se constitui em eficiente  instrumento de transformação da realidade. Para isso, exige de cada um de nós desprendimento para que sejamos capazes de construir os consensos por onde importantes conquistas possam avançar.

Quem caminhou ao lado de Tancredo, após a sua escolha, se lembra do clamor popular das ruas e da grande esperança que tomou conta dos brasileiros. “Não há pátria onde falta democracia”, disse Tancredo, no grande discurso histórico, logo após a vitória. Não sem antes deixar uma preciosa advertência a cada um de nós: “A pátria não é o passado, mas o futuro que construímos com o presente. Não é a aposentadoria dos heróis, mas tarefa a cumprir; é a promoção da justiça, e a justiça se promove com liberdade. Na vida das nações, todos os dias são dias de história, e todos os dias são difíceis”, preconizou.

Trinta anos depois, ainda somos essa nação em tudo promissora, mas ainda em busca de seu futuro. Avançamos, não há dúvida, mas resta intocada uma imensa dívida social do Brasil com milhões de brasileiros. Movido pela memória viva daquele tempo, revisito o compromisso repetido à exaustão por Tancredo: “Enquanto houver, neste País, um só homem sem trabalho, sem pão, sem teto e sem letras, toda prosperidade será falsa”. Esse continua sendo o nosso desafio. Esse continua sendo o nosso compromisso.

 

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Aécio Neves – Entrevista em Florianópolis (SC)

O presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves, concedeu entrevista coletiva, nesta segunda-feira (01/12), em Florianópolis (SC), onde participou de reunião da Executiva Nacional do partido. Aécio Neves falou sobre corrupção no governo federal e respondeu ataques feitos contra ele pelo PT.

 

Santa Catarina lhe deu uma votação bastante expressiva neste ano, em que pese a vitória da presidente Dilma Rousseff. Qual a mensagem que o senhor veio trazer a Santa Catarina?

A minha visita hoje a Santa Catarina tem como primeiro e mais importante objetivo agradecer pessoalmente não apenas os votos, mas o empenho, a mobilização, a confiança do povo catarinense na mudança. Na mudança de valores, na mudança de visão de gestão pública, e também na visão de mundo. Santa Catarina protagonizou, nessas eleições, uma das mais belas páginas, acredito eu, da história política do Brasil. Porque foi às ruas, se mobilizou, e disse ao Brasil que o caminho da mudança era o caminho da verdade, também. O caminho da retomada do crescimento, da geração de empregos de qualidade, da melhoria dos nossos indicadores sociais. Infelizmente não vencemos as eleições nacionalmente, mas a vitória que tivemos aqui em Santa Catarina é o prenúncio de algo que vai continuar. Uma disputa presidencial não é uma corrida de 100 metros, de tiro curto.

Eu acho que aqui nós plantamos, não apenas eu, mas o companheiro Paulo Bauer, os companheiros candidatos a deputado, ao Senado, plantaram aqui uma semente que eu acredito extremamente fértil. De algo que o Brasil precisará ainda viver. Se não foi agora, acredito que será num futuro próximo. Um tempo de maior respeito, inclusive, aos adversários. Onde a disputa política não enverede mais para o caminho da infâmia, dos ataques pessoais, e possa ser o espaço do debate político, do bom debate político. O que mais me encantou nessas eleições aqui em Santa Catarina foi a mobilização de setores da sociedade que tradicionalmente não tinham vínculos políticos, ou mesmo tradição de participar de campanhas políticas. Eu recebia, diariamente, inúmeros e-mails, manifestações nas redes, de profissionais liberais, de comerciantes, de participantes de organizações sociais querendo saber de que forma poderiam participar ainda mais ativamente dessa disputa.

Portanto, essa eleição deixará duas marcas distintas e, ao meu ver, muito fortes: a primeira, infelizmente é protagonizada pelos nossos adversários – a infâmia, a calúnia, o terrorismo para com aqueles que mais dependem da ação do Estado, aterrorizados com a possibilidade de perderem os seus benefícios, segundo dizia falsamente o governo. Mas teve um outro lado nessa eleição, uma outra marca. E é essa a marca que, acredito, ficará ainda mais profundamente lembrada nos nossos corações, nas nossas mentes. O Brasil despertou. Uma parcela do Brasil que estava adormecida acordou, foi para as ruas e voltou a querer ser protagonista do seu próprio destino. Então, isso é muito forte.

Hoje, existe uma oposição àqueles que ganharam as eleições com uma conexão direta com a sociedade, com uma conexão permanente na sociedade. Eu percebi isso em todas as visitas que fiz depois das eleições. E agora, nesses dois dias que estou em Santa Catarina, pessoalmente, nas ruas. As pessoas querem continuar participando do processo político. E eu vim aqui dizer para elas exatamente isso: não vamos nos dispersar. Nós temos uma responsabilidade enorme para com o Brasil. Na democracia – eu até escrevi isso recentemente – a vitória e a derrota são faces da mesma moeda, e nós vamos cumprir agora, na oposição, com a mesma determinação, com a mesma coragem, com a mesma responsabilidade para com o país o papel que nos foi determinado. Fiscalizar as ações do governo, cobrar as suas contradições, e os compromissos que assumiu com os brasileiros.

 
Seu colega Luiz Henrique da Silveira defende a não divulgação de resultados de pesquisas eleitorais. Queria saber que leitura o sr. faz das pesquisas, da divulgação desses resultados no andamento da campanha, e também desse projeto. 

Compreendo as preocupações do senador Luiz Henrique, porque nós sabemos que há, sim, uma certa influência das pesquisas eleitorais nas eleições. Agora, houve, há um tempo atrás, uma decisão do Supremo Tribunal que considerou inconstitucional essa não-divulgação, o impedimento da divulgação. Eu temo que esse projeto, por mais bem-intencionado que seja, ele novamente bata nessa posição do Supremo Tribunal Federal. O que eu tenho uma convicção clara é de que institutos de pesquisa que trabalham para partidos políticos ou para governos que disputam as eleições devem ser impedidos de trabalhar para veículos de comunicação. Aí sim, eu acho que há o conflito de interesses. Inclusive, nos Estados Unidos isso é proibido. Você eventualmente trabalha por um governo ou partido político e trabalha para veículos de comunicação como se, na hora que divulga os resultados, é como se não tivesse vinculação com determinado partido. Eu acho que essa separação já seria, enfim, aprimorar o processo das pesquisas eleitorais.

 

O sr. disse ontem que não perdeu para um partido, mas para uma organização criminosa. O PT anunciou agora a tarde que vai entrar com uma ação.

Na verdade acho que eles estão chegando um pouco tarde, porque essa expressão foi a mesma utilizada pela Polícia Federal no momento em que desbaratava essa quadrilha que atuou durante doze anos na Petrobras. Eu poderia citar inúmeras outras declarações como a do ex-presidente do STJ, dita recentemente, o ministro Fischer, que dizia que nenhum outro país do mundo viveu tanta roubalheira – as palavras são do ministro, ex-ministro do STJ – como o Brasil. O ministro Trisotto, chamado a definir um mandato de segurança para um dos membros da quadrilha, que ele negou dizendo que é uma das maiores vergonhas da humanidade a corrupção que se instalou no Brasil. O PT tem esse vício. Ao invés de interpelar os seus membros que cometeram crimes, como, por exemplo, na época no mensalão, os tratou como heróis nacionais.

Agora, ao invés de interpelar, por exemplo, o tesoureiro do seu partido, acusado por um dos membros da quadrilha de ser uma parte desse processo, O PT quer processar o acusador, como, aliás, vão fazer com a própria Polícia Federal. Essa eleição, como disse aqui, infelizmente, teve essa marca da utilização, sem qualquer limite, da máquina pública. Os recursos ou parte dos recursos desse esquema de corrupção, há indícios de que possam terem sidos utilizados na própria campanha eleitoral.

O que temos é que aguardar que a Polícia Federal faça, sem qualquer tipo de cerceamento, as investigações que tenha a fazer. Não retiro absolutamente nada do que disse. Vi até uma declaração do líder do PT no Senado nessa direção, me fazendo acusações. Em relação ao líder Humberto Costa (PT-PE) até relevo o momento difícil por qual ele passa, porque ele tem que dividir suas idas à Tribuna em algumas delas acusar a oposição e em outras para se defender da acusação de ter sido beneficiário na sua eleição de recursos do esquema de corrupção da Petrobras.

 

Muitos foram às ruas inclusive com cartazes pedindo o retorno da ditadura militar. Essas manifestações no qual o seu candidato à vice participou, o sr. acredita que é por aí ou não?

Acho que a nossa história fala por si só. Somos, e eu pessoalmente, filhos da democracia. As nossas manifestações públicas, em eventos como esses, serão sempre no limite da democracia. E nós condenamos veementemente uma minoria que se utiliza desses eventos, dessas manifestações naturais e espontâneas da população para virem com esse saudosismo. Ao contrário. Fui o primeiro a assumir a derrota nas eleições, poucos minutos depois do resultado quando telefonei para a presidente eleita. Agora não nos tirarão a capacidade e o direito de fazer oposição, de nos manifestarmos de forma pacífica como viemos fazendo.

Na verdade, vejo uma certa analogia em relação ao que vem acontecendo, a utilização desses movimentos, minoritários, saudosistas, a que você se referiu, como alguma coisa que aconteceu lá atrás naquelas manifestações populares em que centenas de milhares de pessoas foram às ruas em julho. Naquele momento o que acontecia? A sociedade resolveu se manifestar contra governos, contra os políticos em geral. Aí surgiram os Black Blocs que passaram a depredar, a fazer atos de extrema violência que afastou as pessoas das ruas. Na verdade, esse movimento saudosista, essas manifestações extremamente minoritárias contra a democracia não têm o nosso endosso. Têm o nosso repúdio. Temos que estar atentos para que elas não afastem das ruas aqueles que queiram, no limite da democracia, se manifestar em favor não apenas do nosso nome, mas em favor de serviços públicos de melhor qualidade, em favor de um futuro de mais crescimento de melhor para os brasileiros.

 

O primeiro grande ato de oposição deve ser amanhã (02/12)? Barrar novamente a meta do superávit?

O que estamos assistindo, e acho que todos vão concordar comigo, talvez seja o maior estelionato eleitoral da história, porque a presidente, poucos dias depois da eleição, começa tomar as medidas que ela condenava, mas não condenava superficialmente, condenava com extremo vigor. A presidente da República dizia que aumentar os juros era tirar comida da mesa do trabalhador. Nós vimos isso, esses ataques que sofremos. Inclusive não apenas eu. Marina, antes da Marina o próprio Eduardo. Três dias depois das eleições houve aumento da taxa de juros. A presidente dizia, e seus aliados, que aumentaríamos o preço dos combustíveis se vencêssemos as eleições, dentre outras maldades, entre aspas. Foram cinco dias apenas depois das eleições para que o aumento dos combustíveis estivesse aí. E o que estamos vendo é a agenda do equilíbrio das contas, que preguei durante a campanha eleitoral, está sendo assumida pela presidente. Isso do ponto de vista do Brasil é positivo.

A grande dúvida é saber que tipo de autonomia esses novos ministros da área econômica terão. Porque na verdade, o que eles disseram no momento de anúncio dos seus nomes exatamente o oposto do que disse a presidente ou a candidata a presidente durante toda a campanha eleitoral. Acho que no mínimo ela deveria se dirigir aos seus próprios eleitores, em primeiro lugar, que votaram em um país equilibrado, próspero, sem problemas com inflação, com crescimento sustentável ao longo do tempo, era o que ela dizia na campanha eleitoral, e agora, se deparam com um outro Brasil. Eu disse também recentemente que talvez a ausência dela no anúncio dos ministros da área econômica tenha sido exatamente para não ter de passar o constrangimento de, nos corredores do Palácio, a presidente Dilma se encontrar com a candidata Dilma, que não teria como explicar para ela as medidas que estava tomando agora.

 

Como o sr. vê esses nomes?

São nomes qualificados. A grande questão é essa que eu coloquei: que tipo de autonomia eles terão? Qual a política econômica que vai ser executada? É a da presidente da República ou é a anunciada por esses nomes? O tempo é que vai dizer, mas a medida que o governo toma no Congresso Nacional é absolutamente contraditória com o discurso desses ministros. Porque eles falam em transparência fiscal, equilíbrio das contas. Mas o que o governo quer émais uma maquiagem fiscal, porque se aprovarem, e eles têm maioria para isso, mas vamos lutar muito, estamos indo hoje ao lado do senador Paulo Bauer para Brasília. Vamos lutar muito amanhã para que esta violência não ocorra. Porque a conseqüência não é apenas econômica.

A conseqüência é para os cidadãos, para a população que mais precisa de empregos. Porque em um momento em que há mais esta maquiagem fiscal, obviamente, a perda de credibilidade da condução da nossa economia, isso afugenta investidores, coloca em risco a nota de crédito do país. Isso implica em quê? Na geração de empregos. Portanto, a minha preocupação é a sinalização equivocada que esta medida dá. Porque a manha, que autoridade terá o governo federal, por exemplo, para cobrar que os governadores de estado cumpram os percentuais mínimos de investimento em saúde, de 12%, ou que os prefeitos cumpram o percentual de investimentos em educação? Porque a lógica do atual governo é o seguinte: eu não cumpro as metas pré-estabelecidas e aí utilizo a minha maioria e mudo a lei. Não, a lei está aí para ser cumprida. Esta Lei de Diretrizes Orçamentárias foi amplamente discutida no Congresso Nacional. O superávit proposto e aprovado na lei já é muito aquém do que foi debatido inicialmente. E o que fez o governo ao perceber que não cumpriria?

Ao invés de reorganizar os seus gastos, ampliou os seus gastos confiando exatamente na subordinação do Congresso Nacional. E um  Congresso que não se respeita, que não cumpre as suas prerrogativas, não pode querer ser respeitado pela sociedade brasileira. Portanto, será um dia de fazermos um brado claro, um grande chamamento à responsabilidade do Congresso Nacional. Até porque, antes de sermos oposição ou base de governo, somos parlamentares, representamos segmentos de pensamento da sociedade. E esta  sinalização que o governo dará em aprovar esta modificação na LDO vai na direção oposta àquilo que os ministros tentaram dizer. O que os ministros tentaram dizer? Não, vamos resgatar a credibilidade deste governo que a perdeu durante todos os últimos anos. Portanto, amanhã é uma hora de a oposição, mesmo minoritária, estar unida e, pelo menos, no embate político, vencer o debate.

 

O que o sr. achou da indicação do senador Armando Monteiro para o Ministério do Desenvolvimento?

Tenho uma boa relação com o senador Armando Monteiro. A presidente, mais uma vez, apresenta contradições porque fez o discurso em uma direção e coloca no Desenvolvimento e na Agricultura os líderes patronais, os líderes das entidades de classe patronais. Acho que é um governo de duas cabeças. É um governo que diz uma coisa e pratica outra. Mas do ponto de vista pessoal eu respeito o ministro e espero que ele possa fazer, em benefício do Brasil, um bom serviço porque não houve área ou setor mais prejudicado nesses últimos anos do que o setor industrial que estaria sob a responsabilidade desse ministério. Temos a indústria hoje participando com cerca de 13% da constituição do nosso Produto Interno Bruto. É menos do que participava na época de Juscelino Kubitschek há 60 anos. E um país que não tem uma indústria sólida não gera empregos de boa qualidade. O Brasil não pode se satisfazer em ser o país do pleno emprego de dois salários mínimos ad eternum. Temos de qualificar a nossa indústria, garantir competitividade, aumentar a produtividade e esse é o grande desafio daqueles que vão, agora, conduzir o Brasil.

 

Sobre a reunião de amanhã, vai ter apoio da base aliada?

Nós já estamos fazendo isso.  Os líderes estão lá reunidos e já estamos fazendo isso não apenas amanhã, estamos fazendo isso desde a discussão na Comissão de Orçamento, fizemos um embate muito duro, conseguimos algumas vitórias. Conseguimos na semana passada o adiamento desta votação, mas temos a noção clara de que não temos os votos suficientes. Então, queremos no discurso e no convencimento, inclusive a setores da base aliada, mostrar que o Congresso Nacional não pode ser um puxadinho do Poder Executivo. Então, a minha responsabilidade, a de todos nós, do senador Paulo, amanhã, é exatamente mostrar que para o Brasil, é fundamental que as leis sejam cumpridas e não modificadas ao bel-prazer do governante de plantão.

Senador Aécio Neves participa de lançamento da biografia de Arthur Virgílio Filho

O senador Aécio Neves e o prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto, nesta terça-feira (08/04), no Salão Nobre da Câmara dos Deputados, em Brasília, durante lançamento do livro “Artur Virgílio Filho”, ensaio biográfico e coletânea de discursos do senador amazonense de autoria do jornalista Mário Adolfo.

Arthur Virgílio Filho foi deputado estadual e federal pelo estado de Amazonas e um dos responsáveis pela criação da Universidade Federal do Amazonas (Ufam). Eleito senador da República em 1962, foi cassado em 1969, após a entrada em vigor do AI-5, durante o regime militar.

Para Aécio Neves, o livro da coleção Perfis Parlamentares, editada pela Câmara dos Deputados, faz justa homenagem ao pai do prefeito Arthur Virgílio Neto, ao resgatar a história de um dos mais atuantes parlamentares na luta contra a ditadura militar.

Na foto, o ex-ministro Almino Afonso discursa durante lançamento do livro.

A longa noite

Em 1964, data do golpe militar que tirou do país duas décadas de liberdades, tinha apenas 4 anos. Somente bem mais tarde, já na adolescência, pude compreender a real dimensão da longa noite do regime de exceção que se abateu sobre a vida nacional. Mesmo ainda sem ter militância política, era impossível não respirar o clima de terror em vigência nos anos de chumbo. Para mim, particularmente, a ele acrescentavam-se as aflições do meu avô, Tancredo, na sua longa, paciente e determinada jornada em direção à redemocratização do País.

Foram anos em tudo penosos e angustiantes. Não era apenas a construção política que demandava reuniões varando as noites intermináveis. Lembro-me, ainda muito jovem, do telefone insistente e os pedidos de ajuda que se acumulavam.

Tancredo trabalhava diuturnamente cerzindo sua teia incomparável de contatos e, ao lado de outros muitos nomes prestigiados da intelectualidade, do clero e da própria política, tentava fazer valer apelos e argumentos em defesa de estudantes, artistas, ativistas de correntes diversas, quando não de seus familiares, atingidos em sua integridade pela fúria do totalitarismo militar.

Comecei minha atuação política na luta pela redemocratização do Brasil, no começo dos anos 80, quando as oposições viviam um grande impasse sobre o futuro imediato.

De um lado, já havia alguma abertura, a anistia e as eleições diretas para governadores de estado. Metalúrgicos, bancários, professores e outras categorias haviam reconquistado o direito de greve e se organizavam em centrais sindicais de expressão nacional. Os estudantes tinham reerguido a UNE. Exilados e banidos estavam de volta ao convívio de suas famílias e retomavam a militância. Uma profunda reorganização partidária começava a brotar da aglutinação de diferentes correntes de opinião.

De outro lado, o conflito de interesses demonstrava que os militares não deixariam facilmente o poder. Para quem não acreditava na determinação desse continuísmo, atentados como o da OAB e do Riocentro se incumbiram de dissipar a dúvida. A batalha pela democracia estava pela metade, inconclusa. Sem eleições diretas para presidente da República, o fim da ditadura militar, que assombrava o país desde 1964, seria uma miragem.

O caminho a seguir era o do fortalecimento crescente da unidade entre as oposições. E o de uma condução madura, para que a reconquista plena da democracia não desaguasse num banho de sangue, como ocorreu em tantos episódios na história das transições políticas – direção apontada, não sem polêmicas e dissensões, por brasileiros da grandeza de Tancredo Neves e Ulysses Guimarães, para citar apenas dois nomes, por meio dos quais rendo homenagem a inúmeros combatentes daquelas jornadas.

Ao final, o golpe militar de 1964 impactou minha vida definitivamente. Foi na luta para sua superação – iniciada ainda na campanha de Tancredo ao Governo de Minas; depois na memorável campanha das “Diretas Já” e na vitória de Tancredo à Presidência –, que iniciei minha vida política, incorporando as grandes lições e aprendizados que me acompanham até hoje. Entre eles, a compreensão da política sem sectarismo, respeitando as diferenças e a contribuição que cada um pode dar ao país.

Acredito que o “Diretas Já” foi um movimento que deveria estar mais presente na nossa memória, pelo que ainda é capaz de nos ensinar. Lideranças como Tancredo, Ulysses, Fernando Henrique Cardoso, Leonel Brizola, Miguel Arraes ou Luiz Inácio Lula da Silva reuniram suas melhores energias em torno de uma grande causa nacional. Tudo muito diferente do que acontece no Brasil de hoje, com o estimulo à intolerância política e as reiteradas tentativas de dividir o país entre “nós” e “eles”, como se o fato de ser oposição nos tornasse menos patrióticos.

Recuperar a história é sempre importante. Os jovens, sobretudo, precisam saber mais sobre  aqueles anos, para que esse conhecimento se reverta numa profissão de fé inabalável – o de que a liberdade, em todas as suas dimensões, é um bem insubstituível e que a Pátria, como dizia Tancredo, é tarefa de todos os dias.

 

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Aécio Neves defende resgate de João Goulart e lembra Tancredo 
em sessão do Congresso

O senador Aécio Neves defendeu, na noite dessa terça-feira (19/11) no plenário do Senado, a aprovação do projeto de resolução que anula a sessão de 1º de abril de 1964 que decretou vaga a Presidência da República, destituindo o presidente João Goulart e dando início à ditadura militar.

Em seu discurso, Aécio Neves lembrou o veemente protesto feito à época pelo deputado Tancredo Neves, líder do governo na Câmara, contra a manobra feita pelo então presidente da Casa, senador Auro de Moura Andrade, utilizando-se da saída de Goulart de Brasília para o Rio Grande do Sul.

“A história me permitiu, de alguma forma, estar próximo daquele momento histórico por que passou o Brasil. Aquela fatídica sessão foi ilegal porque João Goulart se encontrava em território brasileiro, quando o presidente Auro de Moura Andrade declarou vaga a Presidência da República. Nas gravações daquela sessão, quem puder ouvi-las, vai escutar, no exato momento em que o senador Auro de Moura Andrade, presidente do Congresso Nacional, declara vaga a Presidência da República, uma voz ao fundo dizia: Canalha! Canalha!. A voz era de Tancredo Neves que havia sido primeiro ministro do presidente João Goulart, e foi talvez uma das únicas, senão a única, pelo menos uma das únicas lideranças políticas nacionais que esteve em São Borja, quando do sepultamento do presidente João Goulart. A anulação daquela sessão é uma resposta que esta Casa dá aos brasileiros de hoje e, sobretudo, àqueles que virão depois de nós, porque, um ato simbólico, como esse, permitirá que os brasileiros conheçam melhor o seu passado e não cometam os mesmos erros no futuro”, disse Aécio Neves, que encontrou-se hoje no plenário com o filho do ex-presidente, João Vicente Goulart .