Aécio Neves – Entrevista coletiva

O presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves, concedeu entrevista coletiva, nesta terça-feira (08/09), em Brasília. Aécio falou sobre aumento de impostos, repatriação de recursos e próxima reunião do PSDB.

Leia a transcrição da entrevista do senador:
Sobre o aumento de impostos.

A oposição é absolutamente contrária ao aumento de qualquer tributo, e vai reagir no Congresso Nacional a qualquer artifício que se busque para alcançar esse objetivo. Na verdade, o governo cogita investir em impostos como o IOF, que são impostos reguladores, com o único objetivo de arrecadar mais. Não é sequer essa a função primordial desses impostos, como não é também a da Cide.

Portanto, é um entendimento das oposições. Nós obstruiremos qualquer tentativa que o governo queira fazer nessa direção. Inclusive se vier a querer aumentar impostos por decreto, vamos reagir aqui no Congresso Nacional buscando anular esse decreto. É inconstitucional o aumento de tributos que não seja a partir de projeto de lei aprovado no Congresso Nacional.

É mais uma demonstração de desespero de um governo que, mesmo com a gravidade da crise, não consegue apontar um rumo para o país, que não seja de um lado supressão de direitos, e de outro aumento de tributos. Essa é uma fórmula absolutamente rudimentar para permitir que o Brasil supere as gravíssimas dificuldades nas quais o governo do PT nos mergulhou.

Portanto, é importante que fique claro que eles não contarão com qualquer boa vontade da oposição. Mais do que isso, com a nossa oposição firme e clara para impedir que a população brasileira, principalmente os trabalhadores, voltem a ser os mais penalizados pelo desgoverno e a irresponsabilidade com que o Brasil vem sendo conduzido nos últimos anos.


E um imposto temporário, como chegou a ser especulado?

Nem se fosse temporário porque nós já passamos da idade de acreditar em conto da carochinha. Não existe um imposto temporário que depois não se transforme num imposto permanente. Temos aqui já experiência nessa direção.

Infelizmente, a equipe econômica e o próprio governo não conseguiram apontar um caminho que permita, aí sim, a recuperação dos investimentos e o aumento da arrecadação. As medidas patrocinadas por este governo até aqui foram, todas elas, recessivas. E é por isso que há de um lado, a diminuição da arrecadação, das receitas, e o governo não consegue comprimir do outro lado, as despesas.

A fragilidade do governo hoje é tamanha que o desenho inicial desse ajuste que visava exatamente você conter as despesas, diminuir algumas delas e aumentar a receita deu efeito inverso. As receitas não aumentam e, na verdade, o que nós estamos vendo é o governo que não consegue fazer com as despesas diminuam.

Infelizmente o que nós temos é um cenário de enorme gravidade a nos esperar à frente das próximas semanas e nos próximos meses.


Sobre a MP que repatria recursos.

Nós sempre vemos com muita preocupação essa proposta até porque não nos foram apresentadas as salvaguardas, as medidas que impediriam que por exemplo, recursos ilícitos, do narcotráfico, ou mesmo da corrupção, viessem a ser repatriados.

É uma discussão que as oposições ainda estão fazendo, mas não temos convicção, seja de um lado do volume de recursos que eventualmente possam ser arrecadados com essa repatriação. Não acho – e isso eu antecipo – que sejam suficientes para a consolidação de um fundo que permita o fim da guerra fiscal.

Até porque esse fundo teria que durar ou garantir essa compensação para os estados que iriam perder com a arrecadação do ICMS pelo menos oito anos, e esses recursos entrariam apenas uma vez. Não nos foi esclarecido até agora.

Nós vamos discutir isso ao longo dos próximos dias. Não nos foi dada até agora nenhuma garantia de que, no bojo dessa repatriação, no último ato de desespero do governo para incrementar de alguma forma a sua receita, se não há a possibilidade também de estarmos anistiando, com uma multa ou com impostos que chegariam no máximo a 35%, dinheiro ilícito que se encontra no exterior.


Sobre reunião do PSDB.

Na quinta-feira, dia 17, da próxima semana, o PSDB vai reunir aqui em Brasília alguns dos principais economistas que acompanham o partido para uma discussão mais profunda em relação à gravidade da crise econômica. Nós temos denunciado o seu agravamento, mas nós queremos também apontar caminhos, apontar saídas.

Nós teremos aqui, vou anunciar amanhã os nomes, mas os principais economistas ligados ao PSDB, alguns que vêm desde a época do Plano Real, alguns mais recentemente, vão fazer um diagnóstico mais claro, para que haja uma compreensão do país de quais serão os caminhos a serem trilhados para superarmos a grave crise, repito, na qual o governo do PT nos mergulhou.

Existe um que é essencial para que qualquer medida no campo econômico tenha efetividade: confiança, credibilidade. E isso lamentavelmente o governo e a presidente Dilma perderam, e não sei se recuperam mais.

Alvo errado

 Artigo da jornalista Miriam Leitão – Jornal O Globo – 31/12/2013

O que arruinou as contas externas este ano foi a importação de gasolina. O Brasil escondeu um déficit comercial alto através de uma conta gráfica que registra exportações não feitas de plataformas de petróleo. Mas o governo decidiu punir quem gasta no exterior com cartão de débito, pré-pago ou cheque de viagem. Os viajantes pagarão um IOF de 6,38%, baixado no penúltimo dia útil do ano.

Quando os governos não sabem o que fazer para lidar com um rombo externo eles sempre atacam o turista, que é considerado culpado por viajar e ceder à tentação de comprar a preços bem menores lá fora. O que o governo fez agora lembra os anos 1980, quando, afundado em déficit, o Brasil limitava o volume de dólares a ser levado pelo viajante ao exterior.

Os brasileiros viajaram muito e gastaram bastante no exterior, é verdade. Foram US$ 23 bilhões gastos lá foram, até novembro, contra US$ 6,1 bi que entraram no país com turistas estrangeiros. Isso gerou um rombo de US$ 16,9 bilhões na conta turismo. Mas o buraco mais sério nas contas externas tem sido causado pela importação de gasolina. O governo incentivou o consumo ao zerar a Cide e segurar o preço. A balança registra até novembro US$ 39,3 bi de importação de petróleo e derivados. Parte disso é combustível do ano passado, que ele jogou na estatística deste ano. Como houve apenas US$ 19,8 bi de exportação, o rombo do setor de petróleo e derivados chegou a US$ 19,5 bilhões no ano.

A balança comercial mergulhou no negativo, do qual só saiu no fim do ano. Mesmo assim, foi daquele jeito: a Petrobras faz a plataforma aqui, exporta para uma de suas empresas no exterior e depois aluga de si mesma. Tudo isso se passa no mundo virtual; na realidade o produto não sai do Brasil, mas entra na estatística de exportação. O truque ajudou a empresa a não pagar alguns impostos, como PIS e Cofins, e evitou que o Brasil tivesse um déficit de quase US$ 7 bilhões na balança comercial, o primeiro da história em 20 anos.

O país gasta exorbitâncias com importação de um combustível fóssil, a Petrobras paga mais caro pelo produto do que pode cobrar das distribuidoras, isso prejudica a estatal e tinge de vermelho a balança comercial. Mas quem é perseguido é o turista, que foi viajar para o exterior com cartão de débito ou cheque de viagem.

O viajante vai pagar imposto mais alto nas compras no exterior, mas a gasolina continua pagando zero de Cide. Isso não faz sentido algum, até porque o produto continuará pesando na balança comercial de 2014.

O imposto vai pesar no bolso de quem viaja, mas o déficit de turismo vai continuar. Muita gente viaja ao exterior porque é mais barato do que viajar dentro do Brasil, pagar as diárias dos hotéis; muita gente compra lá fora porque os produtos brasileiros estão mais caros. Contra isso não há argumento nem imposto. O problema não é que muita gente viaja para o exterior, mas o fato de que o Brasil atrai poucos estrangeiros. Isso é que tem mantido negativa a conta turismo.

O ano foi todo de ajeitar os números para eles ficarem apresentáveis. Houve manipulação de preços públicos para que a inflação ficasse no intervalo de flutuação. Houve liquidação de concessões e privatização no fim do ano para melhorar as contas fiscais. O mês de novembro daria déficit primário se não fosse a venda do campo de Libra e as concessões. Houve queima de estoque de desapropriações para reforma agrária depois que o MST mostrou que o governo só havia feito oito no ano inteiro. Ao assinar 92 no seu último dia de trabalho, a presidente Dilma Rousseff disse: “atingimos a meta de fazer 100 desapropriações.”

Em um ano tão cheio de malabarismos, soa normal culpar o cartão pré-pago e o cheque de viagem pelo enorme rombo que se abriu nas contas externas. Mas não vamos perder a esperança de um ano que vem melhor. Feliz Ano Novo.

 

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