Descendo a Ladeira

Aécio Neves – Folha de S. Paulo – 25/01/2016

O mercado do petróleo está passando por um momento de colapso nos preços. Os cerca de US$ 150/barril cotados em meados de 2008 estão cada vez mais próximos dos US$ 20/barril.


E como está a Petrobras neste cenário? Muito mal.

Vítima de uma gestão temerária e irresponsável, a companhia entra no ciclo de baixa bem pior do que outras petrolíferas. Enquanto as ações da Petrobras, entre dezembro e janeiro, caíram 31,6%%, as da Shell e da Exxon caíram 19,5% e 6,1%. Entre 2010 e 2016, durante o governo da presidente Dilma, a queda livre das ações da Petrobras foi de 82%.

A perda de valor não se explica somente pela redução dos preços internacionais. A esta altura, fica difícil separar o que foi incompetência e corrupção do populismo com o manejo dos preços da gasolina e do diesel para fins eleitorais. A política de usar a empresa como se fosse um cheque especial fez com que ela tenha que enfrentar este momento difícil com uma dívida superior a R$ 500 bilhões, a maior entre todas as petroleiras do mundo.

Tudo isso está levando a Petrobras a tomar decisões amargas, antes sempre negadas pelo governo.

A primeira é o corte nos investimentos, como o que veio logo após as eleições, em fevereiro de 2015, de 40%. Depois 20%, no biênio 2015/ 2016. E, agora, uma redução dos investimentos no Plano de Negócios 2015-2019 de mais 24%, gerando uma drástica revisão das metas para 2020.
A segunda decisão é a venda de ativos.

Seria cômico, se não fosse trágico, constatar que o governo que sempre acusou de forma oportunista seus adversários de quererem privatizar a empresa promove agora a maior venda de ativos da história da Petrobras. E o faz, sem visão estratégica, única e exclusivamente para fazer caixa e diminuir seu endividamento, negociando o patrimônio da companhia na bacia das almas.

Acrescente-se a tudo isso a produção futura do pré-sal também comprometida, não só pelo viés de baixa dos preços, mas pela total deterioração financeira da companhia.

Quando o barril estava acima dos US$ 100, por motivos políticos e ideológicos, o governo cometeu um crime contra gerações futuras de brasileiros ao deixar de realizar leilões e instituir o modelo de partilha.
E ainda amargaremos, por um bom tempo, os preços da gasolina e do diesel na bomba bem superiores aos do mercado internacional. Hoje, o triplo do mercado americano.

O caminho para recuperação da Petrobras e seu papel no desenvolvimento nacional não é simples, mas possível. Um bom começo é a discussão no Congresso da proposta do senador José Serra, que propõe mudanças importantes no modelo da partilha, acabando com obrigatoriedades que hoje engessam o bom funcionamento da empresa.

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Brasil Real Petrobrás

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A pior petrolífera

Artigo do jornalista Carlos Alberto Sardenberg – Jornal O Globo – 27/02/2014

 

O melhor negócio do mundo é uma companhia de petróleo bem administrada; o segundo, dizia Nelson Rockefeller, é uma petrolífera mal administrada. E o terceiro, acrescentou um gaiato brasileiro, é a Petrobras.

Seria a venezuelana PDVSA a quarta?

A gestão do negócio é um desastre. Na era chavista, num momento de alta demanda pelo óleo, a empresa conseguiu perder produção e reservas. Isso foi consequência de incapacidade gerencial, na medida em que os postos de comando da estatal foram preenchidos por políticos e militantes. Menos engenheiros, mais companheiros.

Mas como petróleo dá dinheiro mesmo com ofensas, o segundo grande desastre venezuelano foi na utilização das receitas da PDVSA. O que seria o certo? Investir primeiro na própria companhia, de modo a torná-la mais produtiva e mais rica — quando, então, pagaria mais dividendos e mais impostos para o caixa do governo. Com esse bom financiamento, o governo poderia fazer as políticas sociais que quisesse.

Chávez, porém, avançou no caixa da empresa. Convenhamos que era uma tentação irresistível para um político populista: todo mês, aquela montanha de dinheiro ali, dando sopa… Precisa comprar fogão para distribuir nas favelas? Manda a PDVSA comprar. Quem precisa de petróleo e faz fogo barato? A China. Negócio fechado.

Para Cuba e outros amigos, a PDVSA passou a entregar petróleo quase de graça e, ainda assim, pago com o trabalho de médicos e agentes do serviço secreto. Verdade que os médicos também são muito mal remunerados e os agentes, muito úteis para reprimir protestos. Mas o óleo continua saindo barato para os amigos e caro para a PDVSA.

Com tudo isso, não espanta que um dos maiores produtores e exportadores de petróleo do mundo tenha conseguido ficar sem dólares. O caos econômico em que o chavismo meteu a Venezuela é o desastre da PDVSA em escala nacional.

A Petrobras não é a PDVSA — qualquer um percebe isso. Mas, olhando no detalhe, parece que tem muita gente do governo querendo imitar os companheiros venezuelanos.

A estatal brasileira divulgou lucro em seu balanço na última terça. Ontem, as ações da companhia despencaram na bolsa. As ordinárias caíram abaixo dos R$ 13. Valiam mais de R$ 50 há apenas cinco anos.

Não é especulação de mercado. Reflete, por exemplo, a queda na produção nacional, embora existindo muito petróleo para ser explorado. Uma queda tão expressiva que se a produção subir 7% neste ano — conforme promessa da empresa — voltaria ao nível de 2010. Ou seja, a empresa está fazendo muito menos do que poderia. Por isso, vale menos.

A presidente da Petrobras, Graça Foster, ali colocada pela presidente Dilma, não critica a gestão anterior, do tempo de Lula. Mas tudo que ela faz e diz é, sim, crítica a seus antecessores. Diz que, para recuperar a companhia, está cortando custos e mudando sistemas de modo a ganhar mais eficiência e eliminar desperdícios. Feitos por quem?

Também criou um programa de prevenção a fraudes. Notaram a palavra “prevenção”? Pois é, por que não colocaram “combate” à corrupção? Porque seria um ataque direto aos antecessores, também petistas, como elas, Dilma e Graça.

Mas está claro para todo mundo que o programa foi anunciado quando apareceram denúncias fortes, inclusive no exterior.

O governo brasileiro não está avançando diretamente no caixa de sua petrolífera. Mas indiretamente, está. Ao reprimir os preços da gasolina e do diesel, para combater a inflação, o governo obriga sua empresa a importar por um preço e vender aqui mais barato. Prejuízo na veia, dívida em alta.

Nesse ambiente, manda a Petrobras ampliar seus investimentos, inclusive em refinarias alocadas politicamente, uma delas, a de Pernambuco, em sociedade com, ela mesma, a PDVSA.

Graça Foster diz, em resumo, o seguinte: OK, tivemos problemas, mas daqui em diante será diferente. Mas faz algum tempo que diz isso. E faz algum tempo que não consegue seus objetivos, como a crucial correção dos preços dos combustíveis.

E há detalhes, digamos assim, que inquietam. Descobriram que a Petrobras entrou com R$ 650 mil em patrocínios para o Congresso Nacional do MST — aquele em que os congressistas tentaram invadir o Supremo Tribunal Federal. Perguntada, a Petrobras disse que o dinheiro se destinava a uma mostra de cultura camponesa, parte do congresso, e que o patrocínio se alinha com o programa da estatal na direção de uma “produção inclusiva e sustentável”.

Petróleo “inclusivo e sustentável”? Nem a PDVSA conseguiria frase, assim, mais reveladora.

 

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