Opinião – Estadão – 02/10/2013
O aparelhamento do governo pelo Partido dos Trabalhadores (PT) cresce a cada dia, evidenciando que o lulopetismo não tem o menor escrúpulo em colocar a máquina estatal e o dinheiro público a serviço de seu projeto de perpetuação no poder. Reportagens de Adriana Ferraz e Diego Zanchetta publicadas no Estado de domingo e de segunda-feira revelam que na cidade de São Paulo 11 das 12 entidades que tiveram projetos aprovados no programa Minha Casa, Minha Vida – a mais importante iniciativa do governo federal na área de habitação popular – são dirigidas por filiados ao PT e privilegiam correligionários na seleção dos candidatos ao financiamento da casa própria. É dinheiro público usado para atender a interesses políticos do partido que está no poder. O nome disso é corrupção.
Não basta, porém, ser filiado ou ativista do PT para fazer jus ao financiamento imobiliário que deveria ser direito de todo sem-teto com renda familiar de até R$ 1,6 mil, preferencialmente morador de áreas de risco ou deficiente físico. Os candidatos aos 4 mil imóveis oferecidos pelo Minha Casa, Minha Vida em São Paulo precisam também estar associados a uma das entidades que recebem e gerenciam os R$ 238,2 milhões destinados ao programa. E esse vínculo custa, além de uma “taxa de adesão” que pode chegar a R$ 50, o pagamento de mensalidades de no mínimo R$ 25. Ser petista, portanto, é necessário, mas não suficiente. É preciso ainda que o candidato possa pagar a taxa e as mensalidades, o que elimina os muito pobres.
Não param aí as “peculiaridades” do critério petista aplicado para eleger quem tem direito a comprar uma casa popular a partir de R$ 3 mil financiados em 120 meses. Conta pontos ser ativista dos movimentos populares, participar de assembleias e reuniões promovidas pelas tais entidades, inclusive audiências públicas na Prefeitura. Na opinião do advogado Marcio Cammarosano, professor de Direito Público da PUC-SP, é um critério que fere a isonomia a ser observada na seleção de candidatos ao financiamento e, por isso, “inconstitucional, além de escandaloso e absolutamente descabido”.
Na direção atual ou recente das entidades que têm a responsabilidade de planejar as moradias populares e construí-las com os recursos repassados pelo Ministério das Cidades há funcionários da administração municipal como Vera Eunice Rodrigues, comissionada na Cohab, que não se elegeu vereadora pelo PT no ano passado, quando comandou ocupações de imóveis e manifestações de protesto contra o ex-prefeito Gilberto Kassab. Na época, ela era presidente da Associação dos Trabalhadores Sem-Teto da Zona Noroeste, uma das 11 que hoje dominam a área na capital. Ou Luiz Gonzaga da Silva, filiado ao PT há mais de 30 anos, gestor do Movimento de Moradia Centro (MMC).
Essas entidades dirigidas por petistas não se limitam a administrar projetos de moradia popular do Minha Casa, Minha Vida. Comandam também as invasões de imóveis desocupados: só este ano, foram mais de 50 na cidade. E reivindicam o direito de indicar os felizes proprietários de pelo menos 20 mil das 55 mil casas populares que a gestão Haddad promete entregar até 2016. O prefeito sacramentou essa possibilidade por decreto, em agosto.
Nem todas as entidades que trabalham com os sem-teto, no entanto, são vinculadas ao PT. Um exemplo é a Rede Comunidades do Extremo Sul, do Grajaú, que optou por ficar de fora, pelo menos por ora, do Minha Casa, Minha Vida – Entidades, para preservar sua independência política. Um de seus coordenadores, Gustavo Moura, cuja militância nos movimentos populares por moradia para os sem-teto é inquestionável, afirma: “Queremos ter voz, mas mantendo nosso padrão apartidário, mesmo sabendo que essa posição pode nos colocar como inimigos do governo”.
A insuspeita, do ponto de vista dos chamados “interesses populares”, manifestação de Moura, que dias atrás participou da ocupação da Secretaria do Verde, ilustra claramente a lógica petista: para a companheirada, tudo; para os que não aderem, o anátema de “inimigos”.
Leia também aqui.