Aécio Neves – Entrevista sobre os 25 anos da Constituição

O senador Aécio Neves afirmou, em entrevista coletiva, hoje (29/10), em Brasília, que a Constituição de 1988 institucionalizou a democracia no Brasil e trouxe muitos avanços para o país, no que se refere aos direitos individuais e às garantias sociais. Aécio Neves comentou que o primeiro projeto que assinou, como constituinte, foi o que estabelecia o voto facultativo a partir dos 16 anos.

Leia a transcrição da entrevista abaixo:

 

Sobre Constituição de 1988

Na verdade, a Constituinte de 1988 foi o reencontro da sociedade brasileira com as liberdades, com a democracia, com os direitos individuais e com avanços sociais. Tive o privilégio de fazer parte daquele conjunto de brasileiros que teve uma oportunidade histórica, de permitir que o Brasil desse, a partir da Constituinte de 88, os mais vigorosos passos para consolidarmos a democracia que retornava ao Brasil. A constituinte ocorre logo após o encerramento de um ciclo de 21 anos de autoritarismo. E ela surge diferente da sua proposta inicial. Ainda quando havia perspectiva da posse do presidente Tancredo havia um esboço de um projeto inicial que orientaria as discussões da Assembleia Constituinte. O presidente Sarney preferiu não vir por esse caminho e permitiu, portanto, que a própria Assembleia Constituinte, ouvindo a sociedade brasileira, construísse a nova Constituição.

Ela pode pecar por ser extremamente detalhista em alguns aspectos. Mas ela tem a grande virtude de ter incorporados os direitos individuais, direitos sociais, que hoje são inalienáveis, hoje são patrimônio definitivo da cidadania e da sociedade brasileira.

 

Sobre uso da máquina pela presidente Dilma

Não temos hoje mais uma presidente full time, temos uma candidata full time. E as ações do governo, todas elas, são da direção da campanha eleitoral. Lamentavelmente, não há regras que inibam isso, mas o que assistimos hoje é quase que um monólogo por parte da presidente da República. Vamos aguardar que, no tempo certo, no momento da discussão, no momento do contraditório, possamos mostrar que, para o Brasil, é muito bom que esse ciclo que encerre e inicie outro com eficiência na gestão pública, com uma visão mais pragmática e moderna das nossas relações externas, com clareza e transparência nos atos dos governantes. Tenho muita confiança que vamos ter, dentro de um futuro próximo, um novo governo no Brasil.

 

Qual a idade o senhor tinha quando foi Constituinte?

Me elegi com 26 anos. A Constituinte foi dois anos depois, já tinha 28 anos. Existia realmente um grupo mais jovem. Éramos a deputada Rita Camata, mais ou menos também nesta idade, o atual senador e ex-governador da Paraíba, Cássio Cunha Lima e eu. Acho que éramos os mais novos. Portanto, para nós, imagina, é uma experiência extraordinária poder estar participando e ajudando a escrever a história do Brasil e me lembro que o primeiro projeto que assinei e vigora até hoje, ao lado outros colegas, foi o que estabelecia o voto facultativo a partir dos 16 anos de idade, como uma forma de você trazer para a militância, para a participação política, para que se interessassem pela política os jovens brasileiros. Portanto, foi uma experiência extraordinária e me lembro com muito orgulho daquela participação.

 

Balanço sobre avanços da Constituição

Sem dúvida alguma, extremamente mais positivo. Ela trouxe avanços nos direitos individuais, nas garantias sociais. Ela institucionalizou a democracia no Brasil. Ela talvez tenha pecado por um excesso de detalhamento. Na verdade, avança em questões que poderiam ser objeto de regulação, por Lei Complementar. Até mesmo, alguns, por lei ordinária. Mas o arcabouço da Constituição de 88 é extremamente positivo. Permitiu uma página de descentralização inclusive das receitas, de fortalecimento dos estados e municípios do seu escopo. Apenas, a meu ver, este pecado, mas não se pode ter apenas virtudes. Ela é extremamente detalhista, o que gera recorrentes dúvidas na sua interpretação.

 

Sobre projetos que restringem abuso de medidas provisórias (MP)

É verdade, porque o sistema atual faz com que o Parlamento seja uma instituição de segunda linha. Porque ficamos aqui, o tempo inteiro, apenas a discutir e votar medidas provisórias. Não há tempo para a agenda construída pelo Congresso. Apenas homologamos ou não, e na maioria das vezes homologamos, a agenda do Poder Executivo. Quando apresentei um projeto que obrigava que as medidas provisórias fossem à votação, pelo menos inibíamos em parte as suas edições, já que antes da minha presidência na Câmara elas eram reeditadas sucessiva e indefinidamente. Me lembro que, em 2001, tínhamos medidas provisórias sem que estivessem sido votadas, do Plano Real de 1994. Apenas para citar um exemplo.

Estabelecemos uma nova regra. Depois de determinado tempo elas iriam à votação, exatamente para que houvesse uma inibição do governo a suas edições. Mas aí vieram outros efeitos colaterais, como por exemplo, o excesso de trancamento da pauta, e apresentamos agora, já como senador, relatei um projeto de autoria do presidente Sarney, que estabelece outras regras. Infelizmente, apesar de ter sido aprovado por unanimidade no Senado Federal, ele aguarda ainda a deliberação da Câmara dos Deputados.

 

Sobre independência do Parlamento

Em 1988, vimos o reencontro da sociedade com o Parlamento. A Constituição de 1988 trouxe avanços extremamente importantes, seja na garantia de direitos individuais, de avanços sociais, e permitiu a consolidação efetiva da democracia no Brasil. Vínhamos de 21 anos de regime autoritário. Ela teve essa grande virtude. Talvez tenha pecado pelo excesso de detalhamento em várias das suas propostas. Ela desce a temas que poderiam ter sido discutidos através de projetos de lei ou de lei ordinária. Mas tem a virtude de ter interpretado o sentimento da sociedade brasileira.

O Parlamento vem se divorciando da sociedade, a verdade é essa. Hoje, somos um apêndice do Poder Executivo. O Congresso Nacional, a partir da maioria governista, hoje, nada fez mais que homologar as decisões do governo. Nada mais faz que votar a agenda do governo, grande parte dela através de medidas provisórias. Quando presidi a Câmara dos Deputados, consegui aprovar proposta que impedia a reedições indefinidas ou ilimitadas das medidas provisórias.

Exatamente para inibir sua edição. Foi um avanço importante naquele tempo, elas passaram a trancar a pauta. Mas tivemos um efeito colateral, que foi o trancamento excessivo da pauta. Apresentamos nova proposta no Senado, na verdade, relatei uma proposta do presidente José Sarney, que foi aprovada por unanimidade no Senado, mas, infelizmente, não teve até hoje deliberação da Câmara dos Deputados. Já faz quase dois anos. Era preciso que essa proposta fosse aprovada para que o Congresso pudesse, interpretando o sentimento das ruas, ele próprio apresentar sua agenda.

Hoje, o Congresso Nacional não tem autonomia para apresentar uma agenda de projetos. Essa autonomia, infelizmente, foi usurpada pelo Poder Executivo.

 

Sobre pesquisas eleitorais

Essas pesquisas, se você analisá-las com maior profundidade, todas elas mostram que mais de 60% da população não querem votar na atual presidente da República, mesmo tendo ela 100% de conhecimento, uma presença na mídia diária e avassaladora. Acho que quem for para o 2º turno com a atual presidente da República, se é que ela vai para o segundo turno, vence as eleições.

 

Sobre a independência do Banco Central

Acho que não precisa de um regramento legal. Ela pode ser exercida como em parte vem sendo feita hoje pelo governo. A autonomia do Banco Central tem que ser preservada e isso pode ser feito independente de mudanças na legislação.

Share on FacebookTweet about this on TwitterShare on Google+