O senador Aécio Neves falou com a imprensa sobre a proposta de reforma política, o plebiscito, a agenda do Brasil real e a queda da popularidade da presidente Dilma.
São Paulo – SP – 1º de julho de 2013
Sobre proposta de reforma política
Eu me lembro que a última vez em que a presidente da República falou sobre a reforma política foi no dia da posse no Congresso Nacional em seu discurso. Foi até muito aplaudida, inclusive por nós. Nesses dois anos e meio este tema não esteve na agenda do governo. É saudável até que ele esteja agora. Mas isso tem de ser feito com muita responsabilidade. O que estamos percebendo é o governo perdendo o rumo. No afã de dar respostas rápidas à sociedade brasileira, o governo está perdendo o foco mais uma vez. As oposições apresentaram uma agenda para o governo. O governo sequer se dispôs a comentá-la, o que mostra que realmente não há disposição de conversar com as oposições.
Houve convite às oposições?
Até agora não houve. Acho que neste instante até perdeu um pouco o sentido. Mostra que até nisso o governo federal tem dificuldades de tomar uma posição. Anunciou-se que haveria um convite às oposições, mas ela já conversou com todos aqueles que costumam concordar com as suas posições. Talvez até pelas oposições terem uma posição divergente da presidente, talvez por isso não tenhamos sido convidados.
O convite ao sr. não foi feito?
Não foi feito a mim. Não foi feito às lideranças e, repito, acho que perdeu um pouco o sentido. Porque nós apresentamos uma pauta ao governo que passa pelo corte de metade dos cargos em comissão e metade dos ministérios poderiam ser extintos; investimentos na saúde poderiam ser aprovados no Congresso Nacional, assim como na educação; o fim do programa mirabolante, eu diria patético, do trem bala que custará R$ 50 bilhões aos cofres públicos. Poderia se substituído por investimentos nos metrôs das capitais.
Esta é a agenda que a oposição apresentou. Infelizmente o que estamos vendo é o governo mais uma vez dando respostas laterais e tentando, com este plebiscito de reforma política, abster-se da sua responsabilidade.
O sr. está dizendo é que se houvesse o convite não seria aceito de qualquer maneira?
Até estávamos dispostos a aceitar, mas no momento em que parece que a presidente já teve o amém ou a aquiescência daqueles que costumam aquiescer com as posições da presidente, nós temos dúvidas sobre para quê seria esta reunião. Se for para discutir esta pauta, uma pauta que interesse efetivamente ao Brasil, acho que poderíamos aceitar o convite. Mas se for para tirar mais uma fotografia ao lado da presidente da República, acho que ela certamente tem coisas mais relevantes a fazer.
Para discutir plebiscito ou referendo, por exemplo, valeria a reunião?
Acho que não porque esta é a pauta criada pelo governo e que o Congresso deve definir. Defendemos que o Congresso tenha uma agenda rápida para votar a reforma política e que depois seria submetida a um referendo. Isso me parece o mais razoável. Fazendo um plebiscito sobre matérias que não são de opções apenas sim ou não. São de opções múltiplas. É na verdade tentar tirar o foco da questão central. O governo tem fazer o pacto da reforma do Estado, cortando pela metade os ministérios e cargos públicos, até para justificar investimentos em outras áreas.
Fazer um pacto com o Congresso para que tenhamos 10% das receitas líquidas do governo investidas em saúde. 10% do PIB em educação. Projetos de mobilidade, sobretudo nos grandes centros, como as obras do metrô que não foram feitas durante este governo. Esta é a agenda do Brasil real. Esta é parte pelo menos da agenda que levou tantos brasileiros às ruas. A questão da reforma política é necessária, mas tem de ser feita com responsabilidade e, a meu ver, pelo Congresso Nacional.
Temos que ver qual é o objetivo desse plebiscito. Se for esclarecer a população para que ela possa opinar e tomar medidas adequadas, obviamente precisaremos de um prazo maior para que as pessoas compreendam o que é sistema eleitoral, como é feita a questão do financiamento público, o que é coligação proporcional, suas vantagens e desvantagens. Temos que debater a questão do mandato, eventualmente passar para cinco anos sem reeleição. Então, um conjunto de medidas que tradicionalmente, em qualquer parte do mundo, não são submetidas a um plebiscito. Não temos essa tradição, pela complexidade das questões. Se é para fazer com seriedade, é preciso, no mínimo, um tempo razoável para que as pessoas saibam no que vão esta votando. Me parece, mais uma vez, uma manobra, como foi a da constituinte exclusiva, que colocava em risco a ordem jurídica vigente no Brasil. Apenas um instrumento para tirar o foco das questões centrais. A má administração do país, a falta de resposta às questões que são concretas. Da mobilidade urbana, da baixíssima qualidade da educação, da falência do sistema de saúde, do aumento da criminalidade. É isso que as pessoas querem ouvir da presidente da República. Se ela acha que transferindo para o Congresso a responsabilidade de convocar um plebiscito estará de alguma forma abafando tirando do centro essas aflições dos brasileiros, acho que mais uma vez ela se enganará.
Como o sr. vê a queda de popularidade do presidente, mas também do PSDB e de governos do PSDB.
Na verdade, foi um recado claro a toda classe política. Em especial, aos governantes. Como temos no Brasil um centralismo muito grande, vivemos quase que em um Estado unitário, onde o poder central pode tudo, no momento da dificuldade, também, as pessoas tendem a responsabilizar o governo federal. Por isso, a queda da presidente foi maior. E ficou claro que o Brasil cor-de-rosa da propaganda oficial, do Brasil sem miséria, do Brasil de serviços públicos de altíssima qualidade, não existe. O governo federal teve que se confrontar com o Brasil real, onde as pessoas querem empregos de melhor qualidade, querem uma educação de maior qualidade, querem serviços públicos dignos. E se o governo insistir em não dar resposta a essas questões pode ser que a popularidade da presidente continue caindo.
Qual seria uma resposta à altura?
Eu faria algumas coisas simbólicas. O governo paquidérmico que tem hoje o Brasil é uma das motivações dessas manifestações. Eu cortaria pela metade o número de ministérios, metade dos mais de 25 mil cargos comissionados. Cancelaria o programa, por exemplo, do trem-bala, que custará R$ 50 bilhões, enquanto os metrôs das grandes capitais brasileiras precisam de investimentos.
Garantiria o apoio da base, que faltou até aqui, para que 10% das receitas líquidas da União fossem para a saúde, 12% dos estados já vão e 15% dos municípios já vão. Aprovar aquilo que propõe o Plano Nacional da Educação – 10% do PIB investido em educação – a médio, longo prazo, com metas, gestão eficiente no Brasil. Enfim, existe um conjunto de ações que o governo poderia tomar até do ponto de vista simbólico. Quem sabe a presidente da República vir a público dizer que espera que o Supremo Tribunal Federal conclua rapidamente o processo do mensalão e aqueles, eventualmente condenados, seja punidos. É isso, é por isso que clamou a população brasileira. Vejo a presidente da República tratando lateralmente essas questões.
O sr. acredita que esse clima de insatisfação no Congresso, dentro do próprio PT, da base aliada, as discussões sobre fim, ou não, de reeleição, podendo ser tradadas ainda para 2014, o sr. acha que favorece o clima de volta Lula?
Esse é um problema que não é nosso. O PT já está vivendo. O instituto da reeleição, ele quase que te obriga à reeleição, ele é quase que compulsório. A não candidatura de alguém que está no cargo é, no mínimo, a falência daquele governo. Ela vem com um atestado de, enfim, incapacidade de enfrentar os problemas. Mas esse é um problema que não quero comentar, vamos deixar que o PT o resolva no tempo certo.
A nossa preocupação agora é cobrar ações para agenda real do Brasil. E não é essa que o governo busca apresentar ao país, apenas a questão da reforma política. Transferindo à população uma decisão sobre algo que a própria Presidência da República não tem posição. Não seria natural que ela dissesse ao Brasil qual reforma política que acha adequada? Fim de coligações, voto distrital misto, lista fechada, financiamento público? Porque, cada vez mais, vejo confundir-se com a pauta da Presidência da República a pauta do seu partido, do PT. Não podemos fazer uma reforma que seja para perpetuar, ou ampliar, o tempo de permanência do PT no governo. Temos que fazer uma reforma para dar maior representatividade aos partidos políticos, para dar mais eficiência ao processo político. E, obviamente, mais conexão dele com a sociedade.
O PSDB faz alguma autocrítica, considerando as últimas pesquisas.
Todos nós, de alguma forma, recebemos um sinal muito claro. A população brasileira quer respostas. Não foi um sinal apenas a um partido. Mas aquele que está no poder central, que arrecada hoje e que mantém cerca de 70% de tudo do que é arrecadado hoje sobre seu controle, obviamente, sobre ele há uma cobrança maior. Mas temos que ter humildade para reconhecer esse recado que, repito, é a toda classe política brasileira.